VISITAÇÃO
Que é do anjo das asas rutilantes
Com que lutou Jacob, na madrugada?
Que é desse outro, de falas sussurrantes,
Que surgiu a Maria, a fecundada,
Tão casta e sem pecado como dantes?
Que é da estrela, pela mão de Deus lançada
A guiar os incertos caminhantes
Ao colmo da cabana consagrada?
Onde estão os sinais que Deus envia?
Onde estão, que os procuro noite e dia
Sem nunca ver cumprido o meu desejo?
Não os vejo e não sei se eu, que os procuro,
Os não encontro porque sou impuro,
Ou sou impuro porque os não vejo.
(Livro III)
In “Poetas de Hoje”
Portugália Editora
Reinaldo Ferreira
(1922-1959)
SE FLORES JAMAIS ME DERES
Se flores jamais me deres,
Se eu rir e tu não rires,
Se quando eu chegar fugires
Ninguém dirá que me queres!
Se tu ocultar puderes
O que há nesses olhos teus
E que é tão igual nos meus
Ninguém dirá que me queres!
Se alguma vez tu puseres
A minha mão na tua mão
Sem que estremeças, então
Ninguém dirá que me queres!
E se o que te dei me deres
A minha trança e três flores
Não pode haver mais rumores
Ninguém dirá que me queres!
In "Livro IV Dispersos"
Reinaldo Ferreira
(1922-1959)
PASSEMOS, TU E EU, DEVAGARINHO
Passemos, tu e eu, devagarinho,
Sem ruído, sem quase movimento,
Tão mansos que a poeira do caminho
A pisemos sem dor e sem tormento.
Que os nossos corações, num torvelinho
De folhas arrastadas pelo vento,
Saibam beber o precioso vinho,
A rara embriaguez deste momento.
E se a tarde vier, deixá-la vir
E se a noite quiser, pode cobrir
Triunfalmente o céu de nuvens calmas
De costas para o Sol, então veremos
Fundir-se as duas sombras que tivemos
Numa só sombra, como as nossas almas.
In “Poemas”
Livro IV – Dispersos
Imprensa Nacional de Moçambique
Reinaldo Ferreira
1922 – 1959
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