PRAIA
Os pinheiros gemem quando passa o vento
O sol bate no chão e as pedras ardem.
Longe caminham os deuses fantásticos do mar
Brancos de sal e brilhantes como peixeis.
Pássaros selvagens de repente,
Atirados contra a luz como pedradas
Sobem e morrem no céu verticalmente
E o seu corpo é tomado nos espaços.
As ondas marram quebrando contra a luz
A sua fronte ornada de colunas.
E uma antiquíssima nostalgia de ser mastro
Baloiça nos pinheiros.
In "Mar”
Editorial Caminho
Sophia de Mello Breyner Andresen
(1919 - 2004)
Era a primeira vez que nus os nossos corpos
apesar da penumbra à vontade se olhavam
Surpresos de saber que tinham tantos olhos
que podiam ser luz de tantos candelabros
Era a primeira vez cerrados os estores
só rumor do mar permanecera em casa
E sabias a sal, e cheiravas a limos
que tivessem ouvido o canto das cigarras
Havia mais que céu no céu do teu sorriso
madrugava de tudo em tudo que sonhavas
Em teus braços tocar era tocar os ramos
que estremecem ao sol desde que o mundo é mundo
É preciso afinal chegar aos cinquenta anos
para se ver aos vinte é que se teve tudo.
In “O Algarve em Poemas”
Edições ASA
David Mourão-Ferreira
1927 – 1996
NA PRAIA LÁ DA BOA NOVA
Na praia lá da Boa Nova, um dia,
Edifiquei (foi esse o grande mal)
Alto castelo, o que é a fantasia,
Todo de lápis-lazúli e coral!
Naquelas redondezas não havia
Quem se gabasse dum domínio igual:
Oh, castelo tão alto! parecia
O território dum senhor feudal!
Um dia (não sei quando, nem sei donde)
Um vento seco de deserto e spleen
Deitou por terra, ao pó que tudo esconde,
O meu condado, o meu condado, sim!
Porque eu já fui um poderoso conde,
Naquela idade em que se é conde assim…
Porto, 1887
In “SÓ” – Sonetos – 3
Estante Editora
António Nobre
1867 – 1900
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