MÃE
Sei que mordia
nas horas doces
os doces seios
onde crescia.
Sei que exigia
meu chão de terra
a terra dura
onde corria.
Sei que fazia
coisas desfeitas
desfeitas coisas
que não devia.
Sei que esquecia
portas abertas
abertas portas
das quais saía.
Sei que queria
sabendo querer
querendo saber
sei que sabia.
In "O Poeta Descalço"
Editorial Fronteira
João Apolinário
(1924-1988)
MÃE
Olha, meu filho! quando, à aragem fria
De algum torvo crepúsculo, encontrares
Uma árvore velhinha, em modo e em ares
De abandono e outonal melancolia,
Não passes junto dela nesse dia
E nessa hora de bênçãos, sem parares;
Não vás, sem longamente a contemplares:
Vida cansada, trémula e sombria!
Já foi nova e floriu entre esplendores:
Talvez em derredor, dos seus amores
Inda haja filhos que lhe queiram bem...
Ama-a, respeita-a, ampara-a na velhice;
Sorri-lhe com bondade e com meiguice:
– Lembre-te, ao vê-la, a tua própria Mãe!
In “Antologia Poética”
António Correia de Oliveira
(1879-1960)
MÃE, EU QUERO IR-ME EMBORA
Mãe, eu quero ir-me embora - a vida não é nada
daquilo que disseste quando os meus seios começaram
a crescer. O amor foi tão parco, a solidão tão grande,
murcharam tão depressa as rosas que me deram –
se é que me deram flores, já não tenho a certeza, mas tu
deves lembrar-te porque disseste que isso ia acontecer.
Mãe, eu quero ir-me embora - os meus sonhos estão
cheios de pedras e de terra; e, quando fecho os olhos,
só vejo uns olhos parados no meu rosto e nada mais
que a escuridão por cima. Ainda por cima, matei todos
os sonhos que tiveste para mim - tenho a casa vazia,
deitei-me com mais homens do que aqueles que amei
e o que amei de verdade nunca acordou comigo.
Mãe, eu quero ir-me embora - nenhum sorriso abre
caminho no meu rosto e os beijos azedam na minha boca.
Tu sabes que não gosto de deixar-te sozinha, mas desta vez
não chames pelo meu nome, não me peças que fique –
as lágrimas impedem-me de caminhar e eu tenho de ir-m
embora, tu sabes, a tinta com que escrevo é o sangue
de uma ferida que se foi encostando ao meu peito como
uma cama se afeiçoa a um corpo que vai vendo crescer.
Mãe, eu vou-me embora - esperei a vida inteira por quem
nunca me amou e perdi tudo, até o medo de morrer. A esta
hora as ruas estão desertas e as janelas convidam à viagem.
Para ficar, bastava-me uma voz que me chamasse, mas
essa voz, tu sabes, não é a tua - a última canção sobre
o meu corpo já foi há muito tempo e desde então os dias
foram sempre tão compridos, e o amor tão parco, e a solidão
tão grande, e as rosas que disseste que um dia chegariam
virão já amanhã, mas desta vez, tu sabes, não as verei murchar.
In 'O Canto do Vento nos Ciprestes'
Editora Gótica
Maria do Rosário Pedreira
N.1959
MÃE
Mãe:
Que desgraça na vida aconteceu,
Que ficaste insensível e gelada?
Que todo o teu perfil se endureceu
Numa linha severa e desenhada?
Como as estátuas, que são gente nossa
Cansada de palavras e ternura,
Assim tu me pareces no teu leito.
Presença cinzelada em pedra dura,
Que não tem coração dentro do peito.
Chamo aos gritos por ti — não me respondes.
Beijo-te as mãos e o rosto — sinto frio.
Ou és outra, ou me enganas, ou te escondes
Por detrás do terror deste vazio.
Mãe:
Abre os olhos ao menos, diz que sim!
Diz que me vês ainda, que me queres.
Que és a eterna mulher entre as mulheres.
Que nem a morte te afastou de mim!
In “Diário IV”
Editora Coimbra
Miguel Torga *
1907 – 1995
* Pseudónimo de Adolfo Correia da Rocha
MÃE…
Mãe – que adormente este viver dorido,
E me vele esta noite de tal frio,
E com as mãos piedosas até o fio
Do meu pobre existir, meio partido…
Que me leve consigo, adormecido,
Ao passar pelo sítio mais sombrio…
Me banhe e lave a alma lá no rio
Da clara luz do seu olhar querido…
Eu dava o meu orgulho de homem – dava
Minha estéril ciência, sem receio,
E em débil criancinha me tornava,
Descuidada, feliz, dócil também,
Se eu pudesse dormir sobre o teu seio,
Se tu fosses, querida, a minha mãe!
In “Sonetos Completos”
Publicações Anagrama – Maio.1980
Antero Quental
1842 – 1891
MINHA MÃE
Rosa, flor do coração,
de sete amores em botão
quinze rebentos brotaram;
entre eles, oito floriram,
catorze botões surgiram,
novas Rosas germinaram.
Quantas mais tu irás ver?...
Mais botões irão nascer
das Rosas, da lei da vida;
noventa pétalas, Rosa,
do jardim és flor ditosa
dos botões, Rosa querida.
Neste dia, nossa mãe
que noventa anos tem
sobre a luz dos olhos seus;
tem a sorte de ver flores,
essência de seus amores,
prendas da vida, de Deus.
Mãe! Estás de parabéns,
uma grande herança tens
neste jardim de verdade;
Deus te dê muita saúde,
paz, amor, a plenitude,
da sublime felicidade.
24/04/2007
In “Triângulos Poéticos I”
1ª. Edição – Abril de 2008
artEscrita Editora
Ferreira da Costa
N. 1945
MÃE…
Hoje em ti pensei,
longe do murmúrio,
da existência do meu ser
que em ti deixei
quando decidi nascer.
Hoje parei para reflectir
nessa tua imagem de mulher,
quedada ao ver-me sorrir,
numa etapa de vida qualquer,
incentivando-me a seguir.
És o tesouro qu’em mim guardei
e que sempre irei recordar.
Irás em mim permanecer
porque me vais acompanhar
para nunca me perder,
porque em minhas quedas de criança
amparaste-me com determinação,
orientaste estes meus passos,
agarrando sempre a minha mão.
In “No Silêncio das Palavras”
1ª Edição – Setembro.2007
artEscrita Editora, Lda.
Deolinda Reis
N. 1964
POEMA À MÂE
No mais fundo de ti
eu sei que te traí, mãe.
Tudo porque já não sou
o menino adormecido
no fundo dos teus olhos.
Tudo porque ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.
Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.
Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.
Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos.
Mas tu esqueceste muita coisa;
esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!
Olha – queres ouvir-me? –
às vezes ainda sou o menino
Que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;
Ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa
No meio do laranjal...
Mas – tu sabes - a noite é enorme,
e todo o meu corpo cresceu.
eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber.
Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.
Boa noite. Eu vou com as aves.
In "Antologia Breve "
5ª. Edição – Outubro 1985
Editora Limiar
Eugénio de Andrade
1923 – 2005
MÃE MENINA
Ouvi chamar-te mãe
Olhei incrédula
Ouvi dizer filho vem
Fiquei de pedra
Teus olhos brilhantes
Tez de porcelana
Expressões adolescentes
Olhar de quem ama
Levas pela mão
Esse filho irmão
De tão tenra idade
És sensibilidade
Mãe menina
Quem é que destina
Essa tua sorte
Quem te denomina
Mãe sem te dar o porte
Mãe menina
Quem te leu a sina
E te deu o mote
Para esta rima
A de Mãe precoce
Mãe menina menina Mãe
Tu que dás teu colo
Para consolo
Precisas também
De um colo de alguém
In “Resquícios de Luz”
Colecção Sinais de Poesia
Edição de Formasau – Coimbra
Isabel Seixas
N. 1961
MÃE
Mãe, Mãe!
Inclina-te para mim
e deixa-me beijar
o teu rosto.
Saltar ao teu pescoço
e enlear-te
num abraço apertado.
Permite que meus lábios
digam alegremente
o que me vai na alma
em confissão veemente:
Mãe, Mãe!
Tu és todo o meu ser
a sombra amiga
que me ampara e guia
e que me faz viver!...
Irene Lourenço Martins
In Fátima Missionária
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