AQUELA CATIVA
Aquela cativa
que me tem cativo,
porque nela vivo
já não quer que viva.
Eu nunca vi rosa
em suaves molhos,
que pera meus olhos
fosse mais fermosa.
Nem no campo flores,
nem no céu estrelas
me parecem belas
como os meus amores.
Rosto singular,
olhos sossegados,
pretos e cansados,
mas não de matar.
Uma graça viva,
que neles lhe mora,
pera ser senhora
de quem é cativa.
Pretos os cabelos,
onde o povo vão
perde opinião
que os louros são belos.
Pretidão de Amor,
tão doce a figura,
que a neve lhe jura
que trocara a cor.
Leda mansidão,
que o siso acompanha;
bem parece estranha,
mas bárbara não.
Presença serena
que a tormenta amansa;
nela, enfim, descansa
toda a minha pena.
Esta é a cativa
que me tem cativo.
E pois nela vivo,
é força que viva.
In “Lírica completa” Vol.1
Prefácio e notas de Maria de Lurdes Saraiva.
INCM - Imprensa Nacional/Casa da Moeda - 1980
Luís Vaz de Camões
(1524-1580)
MUDAM-SE OS TEMPOS
Mudam-se os tempos mudam-se as vontades,
muda-se o ser, muda-se a confiança;
todo o mundo é composto de mudança,
tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades
diferentes em tudo da esperança;
do mal, ficam as mágoas da lembrança,
e do bem – se algum houve – as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto.
que já coberto foi de neve fria,
e em mim converte em choro o doce canto.
E, afora este mudar-se cada dia,
outra mudança faz de mór espanto:
que não se mude já como soía.
In “Eu cantarei de Amor – Poesia Lírica de Camões”
Areal Editores
Luís Vaz de Camões
(1524-1580)
LEDA SERENIDADE DELEITOSA
Leda serenidade deleitosa,
que representa em terra um paraíso;
entre rubis e perlas doce riso,
debaixo de ouro e neve, cor-de-rosa.
Presença moderada e graciosa,
onde ensinando estão despejo e siso
que se pode por arte e por aviso,
como por natureza, ser formosa:
fala de quem a morte e a vida pende,
rara, suave; enfim, Senhora, vossa,
repouso nela alegre e comedido;
Estas as armas são com que me rende
e me cativa Amor; mas não que possa
despojar-me da glória de rendido.
In “SE TUDO FOSSE IGUAL A TI”
Poesia de Luís de Camões
Editora Alma Azul – Janeiro 2007
Luís Vaz de Camões
1524 (?) – 1580
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