VIAGEM DE INVERNO
Disse. E a só luz do entendimento
meu corpo iluminou já sem palavras.
Disse a razão que pensa o pensamento
e a sem razão brutal que sobrenada
às almas e paixões, quando escurece
e a morte lê no céu sua alvorada.
Disse o terror da terra e a alegria
que há em passar do mundo ao puro dia.
In "Viagem do Inverno"
Quetzal Editores - 1993
Luís Filipe Castro Mendes
(N.1950)
TENTAÇÃO
Eu não resistirei à tentação,
não quero que de mim possas perder-te,
que só na fonte fria da razão
renasça a minha sede de beber-te.
Eu não resistirei à tentação
de quanto adivinhei nesta amargura:
um sim que só assalta quem diz não,
um corpo que entrevi na selva escura.
Resistirei a te chamar paixão,
a te perder nos versos, nas palavras:
mas não resistirei à tentação
de te dizer que o céu é o que rasa
a luz que nos teus olhos eu perdi
e que na terra toda não mais vi.
"Os Amantes Obscuros"
In “Poesia reunida (1985-1999)”
Quetzal Editores
Luís Filipe Castro Mendes
(N.1950)
MÚSICA CALADA
Dizias que nos sobram as palavras:
e era o lugar perfeito para as coisas
esse escuro vazio no teu olhar.
E demorava a dura paciência,
fruto do frio nas nossas mãos vazias
que mais coisas não tinham para dar.
Dizia então a dor o nosso gesto
e durava nas coisas mais antigas
a solidão sem rasto que há no mar.
In “Poesia Reunida (1985-1999)”
Quetzal, 1999
Luís Filipe Castro Mendes
(N. 1950)
UM SOPRO DO CORAÇÃO
Esquece o que eu escrevi, deita-te aqui perto
e ouve só as minhas palavras sem sentido,
o balbuciar que eu solto antes da voz,
tudo o que há tanto tempo trago preso na garganta.
Nem o ritmo da cantilena aprendida na infância,
nem a música da poesia:
ouve apenas o balbuciar, o sopro antes da voz,
quase um estertor, mas a dizer agora
que estamos vivos.
In “Lendas da Índia”
Publicações D. Quixote
Luís Filipe Castro Mendes
N. 1950
OS AMANTES OBSCUROS
Nossos sentidos juntos fazem chama:
e as fantasias nossas vão soltar
os desejos desertos de quem ama
e em verso ou coração se quis tornar.
Nossos sentidos são matéria prima
de um canto que é mais leve do que o ar;
o mundo todo não nos adivinha:
somos sombra sem luz, sequer luar.
Que o corpo quebre a noite desolada,
que o corvo ceda a voz à escuridão:
mil luzes são o nome da amada;
quem se perdeu no verso é sem perdão.
"Os Amantes Obscuros"
In “Poesia Reunida (1985-1999)”
Quetzal Editora
Luís Filipe Castro Mendes
N. 1950
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