ADORAÇÃO
Vi o teu rosto lindo,
Esse rosto sem par;
Contemplei-o de longe mudo e quedo,
Como quem volta de áspero degredo
E vê ao ar subindo
O fumo do seu lar!
Vi esse olhar tocante,
De um fluido sem igual;
Suave como lâmpada sagrada,
Benvindo como a luz da madrugada
Que rompe ao navegante
Depois do temporal!
Vi esse corpo de ave,
Que parece que vai
Levado como o Sol ou como a Lua
Sem encontrar beleza igual à sua;
Majestoso e suave,
Que surpreende e atrai!
Atrai e não me atrevo
A contemplá-lo bem;
Porque espalha o teu rosto uma luz santa,
Uma luz que me prende e que me encanta
Naquele santo enlevo
De um filho em sua mãe!
Tremo apenas pressinto
A tua aparição,
E se me aproximasse mais, bastava
Pôr os olhos nos teus, ajoelhava!
Não é amor que eu sinto,
É uma adoração!
Que as asas providentes
De anjo tutelar
Te abriguem sempre à sua sombra pura!
A mim basta-me só esta ventura
De ver que me consentes
Olhar de longe... olhar!
In “Amor Idílico”
Colecção Autores Portugueses de Ontem
Livraria Estante Editora – Março.1990
João de Deus
1830 – 1896
ESTRELA
Estrela que me nasceste
quando a vista mal te alcança
nessa abóbada celeste,
onde a nossa alma descansa
a sua última esperança...
Estrela que me nasceste
quando a vista mal te alcança!
Antes nascesses mais cedo,
estrela da madrugada,
e não já noite cerrada...
Que até no céu mete medo
voa essa estrela isolada...
Antes nascesses mais cedo,
estrela da madrugada!
Flores do Campo
In “Campo de Flores”
Poesia Líricas Completas
Coordenado por Teófilo Braga
Livraria Bertrand
João de Deus
1830 – 1896
BEIJO
Beijo na face
Pede-se e dá-se:
Dá?
Que custa um beijo?
Não tenha pejo:
Vá!
Um beijo é culpa,
Que se desculpa:
Dá?
A borboleta
Beija a violeta
Vá!
Um beijo é graça,
Que a mais não passa:
Dá?
Teme que a tente?
É inocente...
Vá!
Guardo segredo,,
Não tenha medo...
Vê?
Dê-me um beijinho,
Dê de mansinho,
Dê!
Como ele é doce!
Como ele trouxe,
Flor!
Paz a meu seio;
Saciar-me veio,
Amor!
Saciar-me? louco...
Um é tão pouco,
Flor!
Deixa, concede
Que eu mate a sede,
Amor!
Talvez te leve
O vento em breve,
Flor!
A vida foge,
A vida é hoje,
Amor!
Guardo segredo,
Não tenhas medo
Pois!
Um mais na face,
E a mais não passe!
Dois...
Oh! dois? piedade!
Coisas tão boas...
Vês?
Quantas pessoas
Tem a Trindade?
Três!
Três é a conta
Certinha e justa...
Vês?
E o que te custa?
Não sejas tonta!
Três!
Três, sim. Não cuides
Que te desgraças:
Vês?
Três são as Graças,
Três as Virtudes,
Três.
As folhas santas
Que o lírio fecha,
Vês?
E não o deixam
Manchar, são... quantas?
Três!
In “Flores do Campo”
2ª edição – 1876
Livraria Universal de Magalhães & Moniz, Editores
João de Deus
1830 – 1896
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