Segunda-feira, 13 de Novembro de 2023

Recordando... Irene Lisboa

MEADOS DE MAIO

 

Chuvoso maio! 

Deste lado oiço gotejar

sobre as pedras.

Som da cidade ...

Do outro via a chuva no ar.

Perpendicular, fina,

Tomava cor,

distinguia-se

contra o fundo das trepadeiras

do jardim.

No chão, quando caía,

abria círculos

nas pocinhas brilhantes,

já formadas?

Há lá coisa mais linda

 

que este bater de água

na outra água?

Um pingo cai

E forma uma rosa...

um movimento circular,

que se espraia.

Vem outro pingo

E nasce outra rosa...

e sempre assim!

 

Os nossos olhos desconsolados,

sem alegria nem tristeza,

tranquilamente

vão vendo formar-se as rosas,

brilhar

e mover-se a água...

 

In “Poesia - I”

Editorial Presença

 

Irene Lisboa

(1892-1958)

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | ler comentários (1) | favorito
Domingo, 31 de Outubro de 2021

Recordando... Irene Lisboa

MONOTONIA

 

Começar, recomeçar, interminamente repetir um

monótono romance, o romance da minha vida.

Com palavras iguais, inalteráveis, semelhantes,

insistir sobre o cansaço e a pobreza disto de viver...

Andar como os dementes pelos cantos a repisar

o que já ninguém quer ouvir.

Levar o meu desprecioso tempo à deriva.

Queixar-me, castigar e lamentar sem qualquer

esperança, por desfastio.

Pôr a nu uma miséria comum e conhecida, chã-

mente, serenamente, indiferente à beleza dos temas

e das conclusões.

Monotonamente, monotonamente.

 

Monotonia. Arte, vida...

Não serei ainda eu que te erigirei o merecido altar.

Que te manejarei hábil e serena.

 

Monotonia! Gume frio, acerado, tenaz, eloquente.

Sino de poucos tons, impressionante.

Mas se te descobri não te vou renegar.

Tu ensinas-me, tu insinuas-me a arte da verdade,

a pobreza e a constância.

Monotonia, torna-me desinteressada.

 

In “Um dia e outro dia… Outono havias de vir”

Editorial Presença

 

Irene Lisboa

(1892-1958)

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Quinta-feira, 25 de Agosto de 2011

Recordando... Irene Lisboa

AFRODITE

Formosa.  
Esses peitos pequenos, cheios. 
Esse ventre, o seu redondo espraiado! 
O vinco da cinta, o gracioso umbigo, o escorrido 
das ancas, o púbis discreto ligeiramente alteado, 
as coxas esbeltas, um joelho único suave e agudo, 
o coto de um braço, o tronco robusto, a linha 
cariciosa do ombro... 
Afrodite, não chorei quando te descobri? 
Aquele museu plácido, tantas memórias da Grécia 
e de Roma! 
Tantas figuras graves, de gestos nobres e de 
frontes tranquilas, abstractas... 
Mas aquela sala vasta, cheia, não era uma necrópole. 
Era uma assembleia de amáveis espíritos, divagadores,

ente si trocando serenas, eternas e nunca 
desprezadas razões formais.

Afrodite, Afrodite, tão humana e sem tempo... 
O descanso desse teu gesto! 
A perna que encobre a outra, que aperta o corpo. 
A doce oferta desse pomo tentador: peito e ventre. 
E um fumo, uma impressão tão subtil e tão

provocante de pudor, de volúpia, de reserva, de 
abandono... 
Já passaram sobre ti dois mil anos?

Estranha obra de um homem! 
Que doçura espalhas e que grandeza... 
És o equilíbrio e a harmonia e não és senão corpo. 
Não és mística, não exacerbas, não angústias. 
Geras o sonho do amor.

Praxíteles. 
Como pudeste criar Afrodite? 
E não a macerar, delapidar, arruinar, na ânsia de 
a vencer, gozar! 
Tinha de assim ser. 
Eternizaste-a! 
A beleza, o desejo, a promessa, a doce carne...


In “Outono Havias de Vir” – 1937

Obras de Irene Lisboa – Vol. I

Editorial Presença

Irene Lisboa

1892 – 1958

 

 

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Sábado, 29 de Maio de 2010

Recordando... Irene Lisboa... Poetisa do Séc. XX

CHUVOSO MAIO! 

Deste lado oiço gotejar 
sobre as pedras. 
Som da cidade ... 
Do outro via a chuva no ar. 
Perpendicular, fina, 
Tomava cor, 
distinguia-se 
contra o fundo das trepadeiras 
do jardim. 
No chão, quando caía, 
abria círculos 
nas pocinhas brilhantes, 
já formadas?
Há lá coisa mais linda 

que este bater de água 
na outra água? 
Um pingo cai 
E forma uma rosa... 
um movimento circular, 
que se espraia. 
Vem outro pingo 
E nasce outra rosa... 
e sempre assim! 


Os nossos olhos desconsolados, 
sem alegria nem tristeza, 
tranquilamente 
vão vendo formar-se as rosas, 
brilhar 
e mover-se a água... 


(sob o pseudónimo de João Falco)


Outono havias de vir latente triste

 

In “Poesia – I” – Obras de Irene Lisboa

Prefácio e notas de Paula Morão

Editorial Presença

 

 

Irene Lisboa

1892 – 1958

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | ler comentários (1) | favorito

.Eu

.pesquisar

 

.Dezembro 2023

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31

.Ano XVI

.posts recentes

. Recordando... Irene Lisbo...

. Recordando... Irene Lisbo...

. Recordando... Irene Lisbo...

. Recordando... Irene Lisbo...

.arquivos

. Dezembro 2023

. Novembro 2023

. Outubro 2023

. Setembro 2023

. Agosto 2023

. Julho 2023

. Junho 2023

. Maio 2023

. Abril 2023

. Março 2023

. Fevereiro 2023

. Janeiro 2023

. Dezembro 2022

. Novembro 2022

. Outubro 2022

. Setembro 2022

. Agosto 2022

. Julho 2022

. Junho 2022

. Maio 2022

. Abril 2022

. Março 2022

. Fevereiro 2022

. Janeiro 2022

. Dezembro 2021

. Novembro 2021

. Outubro 2021

. Setembro 2021

. Agosto 2021

. Julho 2021

. Junho 2021

. Maio 2021

. Abril 2021

. Março 2021

. Fevereiro 2021

. Janeiro 2021

. Dezembro 2020

. Novembro 2020

. Outubro 2020

. Setembro 2020

. Agosto 2020

. Julho 2020

. Junho 2020

. Maio 2020

. Abril 2020

. Março 2020

. Fevereiro 2020

. Janeiro 2020

. Dezembro 2019

. Novembro 2019

. Outubro 2019

. Setembro 2019

. Agosto 2019

. Julho 2019

. Junho 2019

. Maio 2019

. Abril 2019

. Março 2019

. Fevereiro 2019

. Janeiro 2019

. Dezembro 2018

. Novembro 2018

. Outubro 2018

. Setembro 2018

. Agosto 2018

. Julho 2018

. Junho 2018

. Maio 2018

. Abril 2018

. Março 2018

. Fevereiro 2018

. Janeiro 2018

. Dezembro 2017

. Novembro 2017

. Outubro 2017

. Setembro 2017

. Agosto 2017

. Julho 2017

. Junho 2017

. Maio 2017

. Abril 2017

. Março 2017

. Fevereiro 2017

. Janeiro 2017

. Dezembro 2016

. Novembro 2016

. Outubro 2016

. Setembro 2016

. Agosto 2016

. Julho 2016

. Junho 2016

. Maio 2016

. Abril 2016

. Março 2016

. Fevereiro 2016

. Janeiro 2016

. Dezembro 2015

. Novembro 2015

. Outubro 2015

. Setembro 2015

. Agosto 2015

. Julho 2015

. Junho 2015

. Maio 2015

. Abril 2015

. Março 2015

. Fevereiro 2015

. Janeiro 2015

. Dezembro 2014

. Novembro 2014

. Outubro 2014

. Setembro 2014

. Agosto 2014

. Julho 2014

. Junho 2014

. Maio 2014

. Abril 2014

. Março 2014

. Fevereiro 2014

. Janeiro 2014

. Dezembro 2013

. Novembro 2013

. Outubro 2013

. Setembro 2013

. Agosto 2013

. Julho 2013

. Junho 2013

. Maio 2013

. Abril 2013

. Março 2013

. Fevereiro 2013

. Janeiro 2013

. Dezembro 2012

. Novembro 2012

. Outubro 2012

. Setembro 2012

. Agosto 2012

. Julho 2012

. Junho 2012

. Maio 2012

. Abril 2012

. Março 2012

. Fevereiro 2012

. Janeiro 2012

. Dezembro 2011

. Novembro 2011

. Outubro 2011

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

. Abril 2010

. Março 2010

. Fevereiro 2010

. Janeiro 2010

. Dezembro 2009

. Novembro 2009

. Outubro 2009

. Setembro 2009

. Agosto 2009

. Julho 2009

. Junho 2009

. Maio 2009

. Abril 2009

. Março 2009

. Fevereiro 2009

. Janeiro 2009

. Dezembro 2008

. Novembro 2008

. Outubro 2008

. Setembro 2008

. Agosto 2008

. Julho 2008

. Junho 2008

. Maio 2008

. Abril 2008

. Março 2008

. Fevereiro 2008

. Janeiro 2008

. Dezembro 2007

. Novembro 2007

. Outubro 2007

. Setembro 2007

. Agosto 2007

. Julho 2007

. Junho 2007

. Maio 2007

. Abril 2007

.tags

. todas as tags

blogs SAPO

.subscrever feeds