À MORTE
Morte, minha Senhora Dona Morte,
Tão bom que deve ser o teu abraço!
Lânguido e doce como um doce laço
E, como uma raiz, sereno e forte.
Não há mal que não sare ou não conforte
Tua mão que nos guia passo a passo,
Em ti, dentro de ti, no teu regaço
Não há triste destino nem má sorte.
Dona Morte dos dedos de veludo,
Fecha-me os olhos que já viram tudo!
Prende-me as asas que voaram tanto!
Vim da Moirama, sou filha de rei,
Má fada me encantou e aqui fiquei
À tua espera... quebra-me o encanto!
(Reliquiæ,1934)
In “Sonetos de Florbela Espanca”
Colecção Autores Portugueses de Ontem
Edição da Livraria Estante – Junho.1988
Florbela Espanca
(1894-1930)
ÀS MÃES DE PORTUGAL
Ó mães doloridas, celestiais,
Misericordiosas,
Ó mães d’olhos benditos, liriais,
Ó mães piedosas
Calai as vossas mágoas, vossas dores!
Longe na crua guerra
Vossos filhos defendem, vencedores,
A nossa linda terra!
E se eles defendem a bandeira
Da terra que adorais,
Onde viram um dia a luz primeira
Ó mães, porque chorais?!
Uma lágrima triste, agora é
Cobardia, fraqueza!
Nos campos de batalha cai de pé
A alma portuguesa!
Pela terra de estrela e tomilhos,
De sol, e de luar;
Deixai ir combater os vossos filhos
Ao longe, heróis do mar!
Dum português bendito, sem igual
Eu sigo o mesmo trilho:
Por cada pedra deste Portugal
Eu arriscava um filho!
Por isso ó mãe doloridas, pelo leito
De morte, onde ajoelhais,
Esmagai vossa dor dentro do peito,
Ó mães não choreis mais!
A Pátria rouba os filhos, mas é mãe
A mãe de todos nós
Direito de a trair não tem ninguém
Ó mães nem sequer vós!
In “Trocando olhares” 1915-1917
Editora Martin Claret
Florbela Espanca
(1894-1930)
SE TU VIESSES VER-ME…
Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus barcos...
Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca... o eco dos teus passos...
O teu riso de fonte... os teus abraços...
Os teus beijos... a tua mão na minha...
Se tu viesses quando, linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri
E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo
E os meus braços se estendem para ti...
Charneca em Flor - 1930
In “Verbo Clássicos – Florbela – Sonetos”
Editora Ulisseia e Editorial Verbo
Florbela Espanca
1894 – 1930
AMAR!
Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente...
Amar! Amar! E não amar ninguém!
Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi para cantar!
E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...
Charneca em Flor – 1930
In “Sonetos”
Colecção Autores Portugueses de Ontem
Edição da Livraria Estante – Junho.1988
Florbela Espanca
1894 – 1930
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