A FILHA
Ela toma a minha mão, leva-me a ver
esse pedacinho de mundo que nos coube
e eu vejo sempre pela primeira vez
porque tudo muda constantemente.
Cada manhã tem outra estrela-da-manhã
e em todas elas me levanto
para ir ver, pela mão dela,
o novo mundo que nesse dia há.
À noite, vou espreitar
essa pequena mão adormecida
que aprisiona um grão de vento
e o tesouro ameaçado da alegria;
as sombras descansam no escuro
e, a essa hora,
também dorme a mão de Deus,
ninguém segura o fio
que liga a minha a outras vidas.
Nunca quis ter uma bola de cristal
mas poder ir, pela mão da filha,
ver o futuro.
In “O Reino Perdido – 1986”
Álvaro Magalhães
N. 1951 (no Porto)
PEQUENINA
Eu bem sei que te chamam pequenina
E ténue como o véu solto na dança,
Que és no juízo apenas a criança,
Pouco mais, nos vestidos, que a menina...
Que és o regato de água mansa e fina,
A folhinha do til que se balança,
O peito em que correndo logo cansa,
A fronte que ao sofrer logo se inclina...
Mas, filha, lá nos montes onde andei,
Tanto me enchi de angústia e de receio
Ouvindo do infinito os fundos ecos,
Que não quero imperar nem já ser rei
Senão tendo meus reinos em teu seio
E súbditos, criança, em teus bonecos!
Antero de Quental
1842-1891
In Sonetos – Estante Editora
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