NOITE VAZIA
Crescimento do silêncio a devorar as nuvens.
Voo incansável e monótono das aves brancas do cérebro.
Florida e ondulada suspensão da mágoa.
As ferocidades são ternuras desmaiando na estepe adivinhada.
O amor abre goelas bocejantes nos côncavos da ausência do espaço.
E a morte espreitando a lentidão
irradia baçamente a sua despedida.
Noite vazia.
As aves brancas do cérebro
inutilmente abatem as suas asas!
1934
In Revista “Pirâmide”
Nº 3 – Dezembro.1960 – Ano I
Pág. 44
Edmundo de Bettencourt
(1889-1973)
NOCTURNO
Ao meio do canal submarino
a luz cegante é um anjo.
A suspenção do voo ampara...
Que fluido pelos circulos luminosos parados, correrá?
O sorriso escancarado da esfinge mergulhadora
vai mostrando, distante, a galeria óssea que deita
para as ameias dum castelo
com um deserto sem fim na rectaguarda.
Sentinelas de sangue esperam sempre a
sombra e a morte cobertas de ervas secas.
Na atracção do fundo,
aos pés da escadaria do escuro,
jaz a princesa, de verde, adormecida...
1934
In Revista “Pirâmide”
Nº 3 – Dezembro.1960 – Ano I
Pág. 44
Edmundo de Bettencourt
(1889-1973)
PAISAGEM VERDADEIRA
O verde tenro e vivo, de folhagem,
presépio dos meus sonhos, em menino,
pôs-se de luto a par do meu destino,
cego-me a vê-lo imagem de miragem.
Quando, iludido, o busco na ramagem,
já com seus tons mais brandos não atino.
E nesta escuridão, só me ilumino
vendo-o compor-me interior paisagem.
Paisagem de ouro verde, que de mim
sai alongada em foco para a terra,
a procurar vencer-lhe a cerração.
E onde num crepúsculo sem fim
tonta, a esperança, esvoaçando, erra
sobre torres de encanto e de traição!
In “Poemas de Edmundo de Bettencourt”
Assírio & Alvim
Edmundo de Bettencourt
(1889-1973)
HORAS
Gelava o tempo branco do relógio.
Fundiu-se um dia o mostrador
aberto para dentro
num foco por onde as horas negras fugiram enlouquecidas!
Lá para longe na faixa rósea da distância
recuaram ante o incessante alarido dos sinos
e logo regressaram
desesperadamente procurando em vão
o maquinismo do relógio.
Via-se a dia fechado de silêncio
num quadrado de luz amarelada
e de novo preso o pé do jovem
quando ia para sair...
Lisboa, 1934
In Revista “Pirâmide”
Nº 3 – Dezembro.1960 – Ano I
Pág. 44
Edmundo de Bettencourt
(1889-1973)
O SEGREDO E O MISTÉRIO
Mistérios a pouco e pouco vão morrendo
e extenuados de vigília os anjos
são afinal a sussurrantes sibilinas vozes
que desvendam adivinham segredos
atrás de sentinelas
cuja ferocidade é uma ironia de ternura…
Na palidez da luz
cercando uma velha cabeça
a quem um sono de embrião já tolda os olhos
sorriem enigmáticos os sonhos.
1935
In Revista “Pirâmide”
Nº 3 – Dezembro.1960 – Ano I
Pág. 44
Edmundo de Bettencourt
(1889-1973)
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