DOZE NATAIS
Não te lembraste de mim
durante onze meses e meio.
Passaste, encolheste os ombros
e continuaste o teu passeio.
Mas eu estava lá.
Na mãe desesperada,
na criança esquecida,
no velho abandonado,
no homem desempregado.
Durante trezentos e sessenta e cinco noites,
contei quatro ou cinco dias
com alguns risos e alegrias.
Durante meses e meses sem fim,
não te lembraste de mim.
Da minha fome e da raiva
Da solidão que me enche
Do meu desnorte
Das lágrimas, azedas lágrimas…
Do nevoeiro que é minha mortalha.
Da chuva que me agasalha.
Milagrosamente, apareces, com ar soberano
nas duas últimas semanas do ano!
Contigo trazes muita gente:
um empresário que abriu falência,
uma dama vestida com decência,
um político que veio visitar o Norte
e um benfeitor alto, bem falante e “forte”.
Chamam a comunicação social
e oferecem uma noite de Natal.
Tiram, por momentos, um Cristo da cruz
e falam do nascimento de Jesus
– Daqui a doze meses, se Deus quiser,
vamos todos de novo aparecer.
Vamos festejar o Natal com o povo
e desejar a quem sofre, Feliz Ano Novo!
Com estes gestos, com falas assim,
Troçaste de todos, troçando de mim.
Quando o homem se libertar de tanta hipocrisia,
Quando vivermos com alguma justiça social,
vamos ser pessoa. Viver com harmonia
E partilhar, um ano inteiro, o perfume do Natal.
In “Nobre Povo”
Edições Gailivro
Maria de Lourdes dos Anjos
(N. 1950)
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