AQUELE CLARO SOL
Aquele claro Sol, que me mostrava
O caminho do Céu mais chão, mais certo,
E com o seu novo raio ao longe e ao perto
Toda a sombra mortal me afugentava.
Deixa a prisão triste, em que cá estava
Eu fiquei cego e só, com passo incerto,
Perdido peregrino no deserto,
A que faltou a guia, que o levava.
Assim co’ espírito triste, o juízo escuro,
Suas santas pisadas vou buscando
Por vales e por campos e por montes.
Em toda a parte a vejo e a figuro
Ela me toma a mão, e me vai guiando
E meus olhos a seguem, feitos fontes.
In “Poemas Lusitanos” – 1598
Mandado publicar por seu filho, Miguel Leite Ferreira
António Ferreira
1528 – 1569
PROSEGUI, LUSITANOS VALOROSOS
Prosegui, Lusitanos valorosos,
No que, jurado haveis, feliz systema;
Não vos importe o impio que blasfema
Contra os vossos esforços generosos.
De torpes inimigos cavilosos
Lançai aos pulsos vis eterna algema:
De modo, em fim, que a tyrannia trema
De urdir-vos novos laços vergonhosos.
Ávante em vosso férvido denodo;
Esse monstro de peste e de horror tanto
Acabai de sumir no estigio lôdo.
No amor da Liberdade sacrosanto
Mostrai uma constancia ao mundo todo,
Que pelo mundo todo faça espanto.
Soneto VIII
(Sonetos, recitados no Real Theatro de S. João – Porto)
In “Collecção de Poesias Reimpressas e Ineditas”
Tomo I – 1860
Typ. Sebastião José Pereira – Porto
Antonio Joaquim de Mesquita e Mello
1792 – 1884
Nota – Grafia Original
LONGE DE TI
Longe de ti, na cela do meu quarto,
Meu corpo cheio de agoirentas fezes,
Sinto que rezas do outro mundo, harto,
Pelo teu filho, minha mãe, não rezes!
Para falar, assim, vê tu! já farto,
Para me ouvires blasfemar, às vezes,
Sofres por mim as dores cruéis do parto
E trazes-me no ventre nove meses!
Nunca me houvesses dado à luz, senhora!
Nunca eu mamasse o leite aureolado
Que me fez homem, mágica bebida!
Fora melhor ter nascido, fora,
Do que andar, como eu ando, degredado
Por esta costa de África da vida.
Coimbra, 1889
In ” Só” – Fev.1989
Estante Editora
António Nobre
1867 – 1900
AO PORTO
Ó meu severo berço de granito!
(Este lembrar-te é um luar do fim?)
Vi os fiords – não valem o teu rio!
O melhor da tua força manda em mim.
A tua fala é um gume leal.
Avulso, o teu sabor independente,
amigo ou inimigo – uma só fé!
Quando a névoa te cobre – um rosto ausente.
In “Linha de Terra”
Editora Inquérito – Lisboa – 1951
António de Sousa
1898 – 1981
CARTA ABERTA
Diante de ti, que tens fome
ou tremes de cansaço,
perdoa, irmão,
que eu tenha de sofrer
um drama que parece de palavras!
Semeio versos,
tu moirejas nas cavas,
regando a terra com o suor do rosto
e requeimas a carne à boca das fornalhas
e gastas a paciência,
vivendo ao ritmo inumano das máquinas
(eu, é da alma que suo...)
Não é vida este sonho a que me espelho?
Não me dou como tu?
Irmão, perdoa!
Não fui eu quem talhou o meu destino
e a sede de me ser também é inferno!
Irmão, perdoa!
Não feches o teu punho a esta mão sem calos...
Outros, mas também tenho os meus trabalhos:
é com o cerne dos meus nervos
que acendo este luzeiro do meu canto.
Se me não vês assim,
se te pareço, ao rumo dos teus passos,
o passo inútil duma lua inquieta
num céu fechado,
ou apenas um mocho (agoirento e romântico),
não me fuzile a tua voz de pragas!
Não me chames Poeta
como quem cospe um exorcismo!
Sou teu longínquo irmão,
irmão!
Como tu deserdado
e à espera do mesmo:
sete palmos de terra e de silêncio...
In “Terra ao Mar” – Editorial Inquérito, 1954
António de Sousa
1898 – 1981
SONETOS RECITADOS NA PRAÇA DA CONSTITUIÇÃO
(HOJE DE D. PEDRO) NAS NOITES DE 3 E 4 DE MAIO DE 1821,
FESTEJANDO O CORPO DO COMMERCIO DA CIDADE DO PORTO
COM TODA A POMPA A FAUSTA NOTICIA DE TER S. M.
O SENHOR D. JOÃO VI JURADO A CONSTITUIÇÃO.
SONETO X
Foste, ó Porto, o primeiro que esforçado
Soubeste afuguentar Gallos intrusos;
Recobrados por ti antigos usos,
Por ti ao bom Monacharca o Reino dado.
Foste o primeiro que abateste ousado
Ruinosos, domesticos abusos;
Sendo o Porto immortal aonde os Lusos
A bonança feliz tem sempre achado.
Hoje és tu, que distinto mais fulguras
Na adhesão ao teu Rei, quando festejas
Seu grã triumpho sobre harplas duras.
Dando-lhe, sim, de amor provas sobejas,
Mostras que tuas são suas venturas,
Que só para seu bem, teu bem desejas.
In “Collecção de Poesias Reimpressas e Ineditas”
Tomo I – 1860
Typ. Sebastião José Pereira
Antonio Joaquim de Mesquita e Mello
1792 – 1884
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