AMOR
o teu rosto à minha espera, o teu rosto
a sorrir para os meus olhos, existe um
trovão de céu sobre a montanha.
as tuas mãos são finas e claras, vês-me
sorrir, brisas incendeiam o mundo,
respiro a luz sobre as folhas da olaia.
entro nos corredores de outubro para
encontrar um abraço nos teus olhos,
este dia será sempre hoje na memória.
hoje compreendo os rios. a idade das
rochas diz-me palavras profundas,
hoje tenho o teu rosto dentro de mim.
In "A Casa, A Escuridão"
Quetzal Editores
José Luís Peixoto
(N.1974)
AMOR
Disseram-me hoje, Amigo, que te viram;
Que viesses para ver-me, era de crer...
O que eu ouvi!... Fizeram-me sofrer
Por suspeitas, ciúmes que sentiram.
Se soubesses! Choraram e sorriram
Os meus olhos na ânsia de te ver:
Mas tu não sabes - podes lá saber!...
As minhas forças nunca me iludiram!
Olha, amor, fui sublime em paciência:
Pura, inocente, ouvindo sem desdém,
Os insultos cruéis que recebi!...
Não devia doer-me a consciência...
- Nunca a ti o direi nem a ninguém,
Mas foi por te não ver que mais sofri! -
In "O Meu Desejo"
Editora Educação Nacional
Isaura Matias de Andrade
(1908-199_)
APENAS DO AMOR QUERO TÃO ALTO PREÇO
Apenas do amor quero tão alto preço
do mais pouco ou quase nada peço
dias há em que o verso pede rima
como este a querer o que estima
e que não direi; pois que a vida
se se sente desordenada
ou em ardor que começa e finda
imprevisível em cada coisa e nada
ninguém assim o determina.
Apenas de quando em quando vestígios
por entre duas cidades, dois rios
um a norte, outro a sul que te imagina
ou balouça ou adormenta se o penso
querer dizer aqui o que não posso
In “Tumulto”
& ETC. – Edições
Helga Moreira
N. 1950
AMOR É FOGO QUE ARDE SEM SE VER
Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói e não se sente;
é um contentamento descontente
é dor que desatina sem doer;
É um não querer mais que bem querer;
é solitário andar por entre a gente,
é nunca contentar-se de contente;
é cuidar que se ganha em se perder.
É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata lealdade.
Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?
In “SE TUDO FOSSE IGUAL A TI”
Poesia de Luís de Camões – 2007
Edição Alma Azul
Luís de Camões
1524 (?) – 1580
MEU AMOR QUE EU NÃO SEI
Meu amor que eu não sei. Amor que eu canto. Amor que eu digo.
Teus braços são a flor do aloendro.
Meu amor por quem parto. Por quem fico. Por quem vivo.
Teus olhos são da cor do sofrimento.
Amor-país.
Quero cantar-te. Como quem diz:
O nosso amor é sangue. É seiva. E sol. E primavera.
Amor intenso. Amor imenso. Amor instante.
O nosso amor é uma arma. E uma espera.
O nosso amor é um cavalo alucinante.
O nosso amor é um pássaro voando. Mas à toa.
Rasgando o céu azul-coragem de Lisboa,
Amor partindo. Amor sorrindo. Amor doendo.
O nosso amor é como a flor do aloendro.
Deixa-me soltar estas palavras amarradas
Para escrever com sangue o nome que inventei.
Romper. Ganhar a voz duma assentada.
Dizer de ti as coisas que eu não sei.
Amor. Amor. Amor. Amor de tudo ou nada.
Amor-verdade. Amor-cidade.
Amor-combate. Amor-abril.
Este amor de liberdade.
In "Amor Combate"
Joaquim Pessoa
N. 1948
FERVET AMOR
Dá para a cerca a estreita e humilde cela
dessa que os seus abandonou, trocando
o calor da família ameno e brando
pelo claustro que o sangue esfria e gela.
Nos florões manuelinos da janela
papeiam aves o seu ninho armando,
vêem-se ao longe os trigos ondulando...
Maio sorri na Pradaria bela.
Zumbe o insecto na flor do rosmaninho:
nas giestas pousa a abelha ébria de gozo:
zunem besouros e palpita o ninho.
E a freira cisma e cora, ao ver, ansioso,
do seu catre virgíneo sobre o linho
um par de borboletas amoroso.
Gonçalves Crespo
1846 – 1883
SONETO DO CATIVO
Se é sem dúvida Amor esta explosão
de tantas sensações contraditórias;
a sórdida mistura das memórias,
tão longe da verdade e da invenção;
o espelho deformante; a profusão
de frases insensatas, incensórias;
a cúmplice partilha nas histórias
do que os outros dirão ou não dirão;
se é sem dúvida Amor a cobardia
de buscar nos lençóis a mais sombria
razão de encantamento e de desprezo;
não há dúvida, Amor, que te não fujo
e que, por ti, tão cego, surdo e sujo,
tenho vivido eternamente preso!
David Mourão Ferreira
1927 – 1996
In "Os Quatro Cantos do Tempo"
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