ELEGIA
Dos teus olhos líquidos
irrompem musgos transparentes
onde existe um verso amarrotado
ao meio-dia. Um cinzeiro plástico,
resíduos da noite no óleo dos dedos.
Fica. Senta-te aqui na estrofe
desta ilha impar
num triângulo solitário.
Conversemos do curso que vais tirar,
da sede que mato em teus olhos,
de um animal atropelado,
do empréstimo de um livro, do sono
das aves para esconderem a morte.
Conversemos de tudo em vez de olharmos
as fontes secas e as folhas, o enxame
de lágrimas no meio da rua.
Não é meio-dia. Mentira
enquanto acreditávamos. Agora
só acredito em teu sonho. Gostava
de acariciar teus olhos líquidos
e alisar o verso amarrotado.
Mas perdes-te no voo sonoro e pequenino
do avião no horizonte. Eu queria
falar contigo. Olha
a minha voz sequiosa de ser ouvida
nas arestas do silêncio.
Eu queria era falar contigo.
Vivo num tapete de pregos em brasa
dentro do frio, numa lágrima cristalizada.
Vivo de não viver jamais.
Eu queria falar contigo.
A Mecânica do Sexxo XX
In “Poesia Digital – 7 Poetas dos Anos 80”
Campo das Letras
Luís Adriano Carlos
N. 1959
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