SABER ESPERAR...
Saber esperar o que já veio
Saber ter o que há-de vir
é mais do que pôr uma esperança
desmedida no futuro
e ir saboreando o hoje
e o amanhã...
Saber ter olhos para ver o invisível,
e ouvidos p'ra escutar
o que ninguém nos diz,
mas nós queríamos tanto...
Vale a pena sorrir
Quando o que esperam de nós são lágrimas
Vale a pena ver o pôr-do-Sol
e pensar na próxima manhã
Enchamos tudo de futuros
como se eles espreitassem
das nuvens, ou estivessem
à nossa espera para nos dizer
bom dia e para esperarem
até chegarmos lá.
Vale a pena acreditar nos sonhos e
palpá-los mais do que numa esperança vã!
In “Enchamos tudo de Futuros”
Sopa de Letras
Rita Wemans
(1982- 2002)
AO RECEBER A NOTÍCIA
Ao receber a notícia
primeiro senti a cabeça vazia,
uma espécie de lodo
a enrolar-me o cérebro.
Depois pensei na traição
da vida. Olhei em redor;
a casa em ordem, o silêncio
e as fotografias. Sucederam-se
os gestos quotidianos,
lavei o rosto e a água
quente deu-me a impressão
de "me curar da mentira
[de um amor que acaba".
A noite foi difícil,
pensei até que não dormiria.
Mas não, o dia chegou
e como habitualmente tinha
fome, preparei-me
para viver, embora
com a impressão de que algo
se quebrou dentro de mim.
Não morri e reparei
que continuava a chover.
In “Repetir o Poema”
Quasi Edições
Isabel de Sá
(N.1951)
DA ORAÇÃO
Doce quietação de quem vos ama,
Em serviços, Senhor, que tanto quanto
Amado sois, tão longe o fim de tanto,
Subindo mais, e mais, mais se derrama:
Ardendo por arder em viva chama
De amor do vosso amor, a voz levanto;
Sinto, suspiro, choro, colho, e planto
Ao som doutra suave que me chama.
Onde se vai, Senhor, quem vos ofende?
Donde levais, Deus meu, a quem vos segue?
Onde fugir se pode uma de duas?
Morto por quem o mata que pretende,
Ou que extremos de amor há que nos negue
Quem culpas nossas chama ofensas suas?
In “Sonetos”
Frei Agostinho da Cruz **
(1540-1619)
** Nome de baptismo Agostinho Pimenta
COMO QUEIRAS, AMOR...
Como queiras, Amor, como tu queiras.
Entregue a ti, a tudo me abandono,
seguro e certo, num terror tranquilo.
A tudo quanto espero e quanto temo,
entregue a ti, Amor, eu me dedico.
Nada há que eu não conheça, que eu não saiba,
e nada, não, ainda há por que eu não espere
como de quem ser vida é ter destino.
As pequeninas coisas da maldade, a fria
tão tenebrosa divisão do medo
em que os homens se mordem com rosnidos
de malcontente crueldade imunda,
eu sei quanto me aguarda, me deseja,
e sei até quanto ela a mim me atrai.
Como queiras, Amor, como tu queiras.
De frágil que és, não poderás salvar-me.
Tua nobreza, essa ternura tépida
quais olhos marejados, carne entreaberta,
será só escárneo, ou, pior, um vão sorriso
em lábios que se fecham como olhares de raiva.
Não poderás salvar-me, nem salvar-te.
Apenas como queiras ficaremos vivos.
Será mais duro que morrer, talvez.
Entregue a ti, porém, eu me dedico
àquele amor por qual fui homem, posse
e uma tão extrema sujeição de tudo.
Como tu queiras, meu Amor, como tu queiras.
In “Post-Scriptum”
Jorge de Sena
(1919-1978)
ABC ERÓTICO
Abre-te!
Beija-me!
Cobre-me!
Amar-te é volúpia
Brincar é malicia
Carícia é pingo de mel.
Ai!
Basta!
Cala-te!
Abraço-te, queres?
Belisco-te, gostas?
Colo-me a ti, einh?
Ah!
Biscoito
Crocante!
Às nuvens subi
Bebendo o teu néctar
Crescendo-me em ti!
Ata-me!
Bebe-me!
Come-me!
Agora imparável
Brutalmente bom
Cada vez melhor!
In “Descontinuidades”
Noel Ferreira **
(N.1938)
** Pseudónimo de Orlando Manuel Ferreira Caetano
O CÁRCERE DO EGOÍSMO
Um homem ontem vi, que estava preso
Numa prisão estranha.
- «Quem te prendeu?» - lhe perguntei surpreso.
- «Ninguém. Sou livre» E, numa rude sanha,
arrogante retruca: - «É puro engano!
O preso não sou eu. Tu é que vais,
às mãos do vil tirano,
preso e bem preso,
para sempre jamais»…
A todo o homem agrilhoa o jugo
do egoísmo.
Mas – forte vezo,
incônscio servilismo! –
a garra adunca
dum tal verdugo
nos outros vemo-la. E em nós mesmo? – Nunca.
In “Do Homem e da Terra” – Poemas – 1932
Edições “Brotéria” – Lisboa
Serafim Leite
(1880-1969)
. Mais poesia em
. Eu li...
. Recordando... Rosa Alice ...
. Recordando... Rosa Lobato...
. Recordando... Sophia de M...
. Recordando... Fernando Ec...
. Recordando... Hélia Corre...
. Recordando... Edmundo Bet...
. Recordando... Guilherme d...
. Recordando... Fernanda de...
. Recordando... Eugénio de ...