A LAMENTAÇÃO
Há uma lamentação nas coisas imperfeitas
como se amassem, como se recordassem.
Tudo pede um deus. E o lamento
é a própria imperfeição. A terra é fulgurante,
macera as criaturas, dá-lhes alimento,
venenos temperaturas. E sobre os arenitos
depõe restos de chuva, as erosões gravadas
dos apagamentos. A dor deve doer
e os animais agitam-se, movem a cabeça
ao mais leve chamamento. Mas não há chamamento.
Apenas o sussurro de regresso ao horizonte:
um álamo negro, o deus, a voz humana.
In "Movimento e Repouso"
Editora Pedra Formosa - 1994
Carlos Poças Falcão
(N. 1951)
TEMOR DE NÃO HAVER DEUS
Temia não ressuscitar de novo:
eram tantas as mortes, que vivera
no decurso da sua vida até agora,
que morria pra não viver já morto
E continuava cego, só e absorto,
pálido entre símbolos de cera,
a caminhar no tempo, sobre a hora,
tal como sobre a água em passo curto
De tudo o que aprendera não constava
nada, que o ensinasse a morrer já
sem perguntar a Deus, se Deus existe
A certeza maior da sua fé
à maior alegria não quadrava,
mas somente à menor, que é quase triste
In “Sombra das Minhas Mãos”
Editora LG - 1998
António Barahona
(N. 1939)
A MORTE DO AMOR
Se eu pudesse voltar atrás
Não te amava.
É tão mais fácil
Manter o coração quieto no peito
Como se todos os dias
E todas as horas fossem iguais.
A inquietação de me faltares
Deixa os meus olhos tristes
Esperando que aceites
A mão que te estendo.
Mas tu não estás.
Eu parti com a última onda
Sem saber se voltarei um dia,
E o caminho que os nossos pés
Juntos percorreram
Choram a saudade
De ter morrido o amor
Quando dissemos adeus.
In “A Apologia do Silêncio”
Edição do autor - 2012
Ana Brilha
(N. 1979)
WESTMINSTER
Westminster - catedral fria
Como todas as igrejas protestantes,
Onde um relógio avalia
Pelas horas os instantes.
Em redor falta-me tudo
Que inspire a nossa oração.
Corpo de pedra desnudo?
Os olhos cobrem-no em vão!
Como dobrar o joelho?
Tanta imagem sem altar!
E quanto cravo vermelho
Ficará por desfolhar!
Rezarei?
Logo se esquiva
Minha alma
A ir para a frente...
Debaixo de cada ogiva,
Falta-me o chão,
De repente!
In “Cartas de Inglaterra”
Lello & Irmão Editores
Pedro Homem de Mello
(1904-1984)
ESTE DESAJUSTAMENTO COM A VIDA
Este desajustamento com a vida
que tenho creado à força de ser só,
à força de me embriagar de viver
a minha vida ausente;
esta doença de mim
que me torna a vontade estéril
para além de mim mesmo;
este ser o não eu não realidade,
não naturalidade,
mas reflexo congeminativo de mim;
este desencontro que o é afinal comigo
começa a enlouquecer-me.
In Revista “Pirâmide”
Nº 2 – Junho.1959 – Ano I
Pág. 22
Sena Camacho
SIBILA
Um grito surgiu na noite da Grécia Antiga
Não era um deus que gritava, era Ela.
Límpida como a água das fontes.
Pura como a terra.
O grito da Sibila
(O grito da mãe terra? Ou o grito
das mães da terra? Ou o grito
da tua ou da minha mãe?)
O deus nunca grita, faz gritar.
In Revista “Pirâmide”
Nº 2 – Junho.1959 – Ano I
Pág. 29
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