SAÍMOS DOS RUÍDOS DO INVERNO
Saímos dos ruídos do inverno
e saímos do frio em que dormimos
e dormimos ainda ainda temos
sono igual ao inverno e
nada se mudou senão a luz
a saída da luz
que se esforçava no calor do rio
por achar o motor da sua húmida
súbita madrugada ali contida
no silêncio do rio na ferida
por onde pôde a árvore evadir-se da luz
e nada se mudou somente um rasgo
de claridade no clarão da água
rompeu do rio de súbito o motor
In “Os Nomes”
Assírio & Alvim
Gastão Cruz
N. 1941
NATAL
Nasce um deus. Outros morrem. A Verdade
Nem veiu nem se foi: o Erro mudou.
Temos agora uma outra Eternidade,
E era sempre melhor o que passou.
Cega, a Sciencia a inutil gleba lavra.
Louca, a Fé vive o sonho do seu culto.
Um novo deus é só uma palavra.
Não procures nem creias: tudo é oculto.
In “Contemporanea”
Director – José Pacheco
Redactor Principal – Oliveira Mouta
Editor – Agostinho Fernandes
Ano I – Volume II – Nº.6 Ano 1922
Pág. 88
Fernando Pessoa
1888 – 1935
Mantém a grafia original
CONFIDENCIA A PIERROT
Ó Pierrot, velho simbolo cançado,
Toda a saudade em teu olhar se abriga,
E a tua voz num fremito mendiga
Ao Sonho o esquecimento do Passado!...
Irmão Pierrot, ó timido exilado,
Tambem eu ando morto de fadiga,
Minh’alma de si mesma é inimiga,
E eu choro de mim proprio fatigado.
É de mim, é de mim principalmente,
De quem eu mais quizera andar ausente,
E de quem, dia e noite, me acompanho!
Fôra eu pastor, vivesse a errar nos montes...
E perdido entre os ermos horizontes,
De mim e da minh’alma andasse extranho.
Maio 1922
In Revista “Contemporanea”
Director – José Pacheco
Redactor Principal – Oliveira Mouta
Editor – Agostinho Fernandes
Ano I – Volume I – Nº 2 – Ano 1922
Pág. 80
Américo Durão
1894 – 1969
Grafia original
NORA
I
Muito tilintou esta nora.
Isso foi no tempo em que musgos,
heras, caracóis, lagartixas e ferrugem
não se tinham ainda sentado em cima dela.
Agora já não tilinta.
Secou-se-lhe o tilintar, que por sinal
era o som mais húmido do campo,
o mais quebradiço, mas também
mais apto a fecundar.
II
Mas não se extraviou nos complicados
trilhos do tempo:
limitou-se a migrar para dentro de mim.
Guardei-o num baú de que só eu tenho a chave
e donde às vezes o tiro para ouvir de novo
os pingos de prata derretida
caindo insistentes sobre a tarde esguia
que, aproximando-se do fim,
ficava de repente mais sonora
de pássaros e brisas, e de risos
e ralhos vindos da horta.
In “Gaveta do Fundo”
Editora Tinta da China – 2013
A. M. Pires Cabral
N. 1941
SANTA OBIDIENCIA
Ó nobre e humilde obidiencia antiga!
Companheira da paz; do mundo obreira,
Desde que Deus mandou á treva inteira
Que se fizesse luz: e o mando a obriga.
És como a forja ao aço, ao oiro a liga.
Sem ti não ha amor que dure e queira;
Nem ha Familia ou Patria caminheira;
Nem alegre trabalho que prosiga.
Anda na terra desvairada e á solta,
Em vento de soberba e de revolta
E ninguem obedece e crê nos mais.
Vêde Jesus, em seu cruel destino,
Levado pela mão, feito menino...
– “Meu Rei e meu Senhor, onde é que vaes?!” –
Belinho – 1922
In “Contemporanea”
Director – José Pacheco
Redactor Principal – Oliveira Mouta
Editor – Agostinho Fernandes
Ano I – Volume II – Nº.6 - Ano 1922
Pág. 100
Antonio Corrêa d’Oliveira
1878 – 1960
Mantém a grafia original
CANÇÃO
Em sonho, tómo nas minhas,
As tuas mãos de luar,
E tenho duas rolinhas
Nas minhas mãos, a arrulhar.
E depois, em sonho ainda,
Deixando as rolas fugir,
A tua cabeça linda
Afago e beijo, a sorrir.
Continua o sonho mago.
E eu sempre no sonho loiro
Em mil carícias afago
Teu lindo cabelo d’oiro...
E as minhas mãos afagando
Teu cabelo d’oiro mole,
Amor! são a terra andando,
Girando em volta do Sol!
In Revista “Contemporanea”
Director – José Pacheco
Redactor Principal – Oliveira Mouta
Editor – Agostinho Fernandes
Ano I – Volume I – Nº 2 – Ano 1922
Pág. 52
José Bruges d’Oliveira
1899 – 1951
Grafia original
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