NAS MÃOS SINTO A LUZ
Nas mãos sinto a luz, a êxul luz
que vem das paliçadas da mansão,
a luz azul em clarificada zona então
aproxima de mim o seu facho de horizonte.
E logo eu a lembrar o querido monte
em que pousada estava sobracente a ramaria,
e logo eu então a pedir à maresia
que nos brilhos unos do futuro aproximasse
esse rumor de aves onde os raios enfeitasse
e eu oco no caminho que me guia
contivesse as minhas mágoas do passado,
e surgisse ali a minha alma em fogo-fátuo
estivesse eu em toda a dimensão do brusco
a nascer das folhas com a boca em luz arado.
In “Cyborg”
Livros Horizonte
Alexandre Vargas
N. 1952
OS APAZIGUADORES
A tribo é indócil.
Os apaziguadores são boas pessoas.
Eles cantam a paz
na boca das armas.
Eles desarmam as bocas
quando cantam a paz.
Só não desarmam as armas
porque a paz desarmada
passaria a ser paz
e eles ficariam desempregados
porque não há apaziguadores
em tempo de paz.
O medo tocou os apaziguadores,
o medo tocou o gatilho das armas,
e os indóceis ficaram apaziguados,
definitivamente apaziguados,
horizontalmente apaziguados.
E os apaziguadores voltaram aos lares
e com gestos medidos e apaziguados
guardaram as armas, lavaram as mãos,
e distribuíram beijos pacificamente
a toda a família.
In “Cem Poemas Portugueses do Riso e do Maldizer”
Selecção, organização e introdução de José Fanha e José Jorge Letria
Editora Terramar
Sidónio Muralha
1920 – 1982
BASTAVA
Bastava que dissesses a palavra exacta,
que tens aprisionada na garganta,
Bastava que pendurasses
na porta do teu quarto um lenço branco.
Bastava que enfeitasses o chapéu
com as flores que o fim da tarde
pões sedentas da luz dos teus cabelos.
Bastava que me olhasses uma vez ainda.
In “Ofício Diário”
Papiro Editora – 2007
Torquato da Luz
N. 1943
AGORA SOU
Agora sou
porto de silêncio que conhece
a rota da madeira,
porta do sótão
e turbilhão de folhas
que, pela cozinha, arrasta o vento.
Agora sou
a casa que conhece
múrmuras colmeias,
unhas do gato prateado,
o desatino matinal dos pássaros
e o amor das janelas pelas nuvens.
Ao perfume da erva
após a chuva
une-se o do café.
Do tempo passado
a decifrarmos juntos paredes
de granito e cal
vem-nos doce a fadiga.
Repousemos.
In “Cem Poemas Portugueses no Feminino”
Selecção e Org. de José Fanha e José Jorge Letria
Editora Terramar
Flor Campino
N. 1934
INTERROGAÇÃO
Não sei se isto é amor. Procuro o teu olhar,
Se alguma dor me fere, em busca de um abrigo;
E apesar disso, crê? Nunca pensei num lar
Onde fosses feliz, e eu feliz contigo.
Por ti nunca chorei nenhum ideal desfeito.
E nunca te escrevi nenhuns versos românticos.
Nem depois de acordar te procurei no leito
Como a esposa sensual do Cântico dos Cânticos.
Se é amar-te não sei. Não sei se te idealizo
A tua cor sadia, o teu sorriso terno...
Mas sinto-me sorrir de ver esse sorriso
Que me penetra bem, como este sol de Inverno.
Passo contigo a tarde e sempre sem receio
Da luz crepuscular, que enerva, que provoca.
Eu não demoro o olhar na curva do teu seio
Nem me lembrei jamais de te beijar na boca.
Eu não sei se é amor. Será talvez começo...
Eu não sei que mudança a minha alma pressente...
Amor não sei se o é, mas sei que te estremeço,
Que adoecia talvez de te saber doente.
In “Poemas de Amor”
Versões Ana Leal
Edição Alma Azul – Janeiro.2006
Camilo Pessanha
1867 – 1926
AVISOS PARA SOLTEIROS
QUE QUISEREM VIVER
Todo o solteiro que este mundo logra
E por casado assezoado berra
Considere que peste, fome e guerra
O Diabo lhe dá em dar-lhe sogra.
A doce liberdade se malogra,
De todo o paraíso se desterra,
E de viver enfim os termos erra,
Porque em vida se enterra se se ensogra.
Terá sogra ab initio e ante bruxa,
Terá sogra ad perpetuam rei tarascia,
Sogra per omnia secula proluxa;
Que é peste no contacto que lhe encasca,
É fome na miséria que lhe embucha,
É guerra no dragão que se lhe enfrasca.
In “Cem Poemas Portugueses do Riso e do Maldizer”
Selecção, organização e introdução de José Fanha e José Jorge Letria
Editora Terramar
Tomás Pinto Brandão
1664 – 1743
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