PELAS LANDES, À NOITE
Pelas landes e pelas dunas
Andam os magros como pregos,
Os lobos magros como pregos,
Pelas landes e pelas dunas.
Olhos de fósforo, esfaimados,
Numa pavorosa alcateia,
Andam, andam buscando ceia,
Olhos de fósforo, esfaimados.
Na landes grandes, junto às dunas,
Um menino perdido anda,
Anda perdido, a chorar anda,
Nas landes, junto às brunas dunas,
Senhor Deus de Misericórdia,
Protegei o róseo menino,
Protegei o róseo menino,
Senhor Deus de Misericórdia,
Porque nas landes e nas dunas
Andam os magros como pregos,
Os lobos magros como pregos,
Nas grandes landes e nas dunas.
In “Oaristos – Horas – Silva”
Lumen Empresa Internacional Editora – 1927
Eugénio de Castro
1869 – 1944
BREVE POEMA ÉPICO
Sete leões e o profeta no meio,
com óculos, de preto, guarda chuva
e uma saudade desbotada
no bolso do coração.
O céu triste e calado como os mortos;
as colinas à espera de pintor
e o rio como um doido a bater palmas
e a babar-se nas fragas.
Sete leões da terra de ninguém
todos goelas força e sede viva.
O profeta no meio, tão profeta
que o medo lhe parecia Anjo da Guarda.
Magro, pois a comida de palavras
nunca foi coisa que matasse a fome...
corpo talhado a jeito de baínha
ao espírito - uma espada feita de ar.
Sete leões como os sete pecados,
ali, inteiros, no Jardim de Deus;
as portas milenárias em pedaços
e o Todo-Alma a estuar de fé.
A cada uivo – um murmuro versículo;
para o raspar das unhas as mãos juntas
e aos saltos decisivos como raios,
um - Satan, vade retro! e o guarda-chuva!
Depois... tudo acabou na digestão
do profeta, do rio e até do céu!
Mas um poeta virá com outros sóis
para ver nascer flores dos cadáveres dos leões.
Coimbra – 1943
In “Sete Luas”
Editorial Inquérito Lda.
António de Sousa
1898 – 1981
INÊS DE CASTRO
Antes do fim do mundo, despertar,
Sem D. Pedro sentir,
E dizer às donzelas que o luar
E o aceno do amado que há-de vir...
E mostrar-lhes que o amor contrariado
Triunfa até da própria sepultura:
O amante, mais terno e apaixonado,
Ergue a noiva caída à sua altura.
E pedir-lhes, depois fidelidade humana
Ao mito do poeta, à linda Inês...
À eterna Julieta castelhana
Do Romeu português.
(Poemas Ibéricos – 1965)
In “Signos” – Lisboa Editora
Miguel Torga
1907 – 1995
POESIA DE AMOR
Vieram as aves negras em teu nome,
Secas folhas de plátano e de tília...
Amargamente, a fonte segredou-me
Tudo quanto eu sabia
Da sorte de Marília;
E que Dirceu
Poderei ser eu
- Tão infeliz! - nesta prisão sombria.
Ausente embora, continuo
A endereçar-te mil endechas.
Não sei mais nada: sei amor. Assim destruiu,
Pela canção doentia
Coloração das minhas queixas.
Bárbara escrava?
Que me importava?
Além do amor, o meu amor quer melodia.
Cantei às flores do pinho, verde e vivo;
Cantei nas margens verdes das ribeiras.
- Quando hás-de ver que foste só motivo
Para falsas canções tão verdadeiras?
In “Tempestade de Verão”
Guimarães Editores
David Mourão-Ferreira
1927 – 1996
A UMA ANDORINHA
Nas brisas da tardinha
Pára teu vôo um pouco;
Ouve um poeta, um louco,
– Escuta-me andorinha!
Um pouco deixa os ninhos;
Attende as vãs loucuras,
–Tambem nas sepulturas
Vôam os passarinhos!
Nem sempre o azul ethereo
Quaes flexas vão cortando,
– Também riem, voando,
No chão do cemiterio!
Lavam os pés rosados
Nas urnas funeraes;
–Tu, mesmo, nos telhados
Moras das cathedraes!
Não fujas d'um poeta,
Que ha nuvens mais sombrias!
– Tu já moraste uns dias
No nicho d'um propheta!
Por tanto, tu que adoras
A primavera e o Sul,
Dize-me, – no alto azul,
Quem faz sempre as Auroras!
Quem dá tintas vermelhas
Ao Sol poente que arde?
– Quem coze as nuvens velhas,
E accende o astro da tarde?
Os campos dão renovos
Tambem, n'outras espheras?
– Quem faz as primaveras?
– Quem faz os astros novos?
Quem faz a ave-flor?
Quem tinge o temporal?
– Quem faz a pomba, côr
Do lyrio virginal?
No Sol ha violetas,
E rios, campos, vinhas?
– Dize, se nos planetas?...
Tambem ha andorinhas...
E tu que mais almejas?
Tens sol, astros e ninhos--
Tens tudo o que desejas...
– Luz, grãos, pelos caminhos!
Ó triste ambicionar!
Ó santo e vão delirio!
– Talvez, ó filha do Ar
Quizesses ser um lyrio!
In “Claridades do Sul”
Braz Pinheiro – Editor
Lisboa – 1875
Gomes Leal
1848 – 1921
MANTEM A GRAFIA ORIGINAL
TRAZ OUTRO AMIGO TAMBÉM
Amigo
Maior que o pensamento
Por essa estrada amigo vem
Não percas tempo que o vento
É meu amigo também
Em terras
Em todas as fronteiras
Seja bem-vindo quem vier por bem
Se alguém houver que não queira
Trá-lo contigo também
Aqueles
Aqueles que ficaram
(Em toda a parte todo o mundo tem)
Em sonhos me visitaram
Traz outro amigo também
In ”Textos e Canções”
Relógio d’Água Editores – Out.2000
José Afonso
1929 – 1987
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