SOMOS ASSIM AOS DEZASSETE
Somos assim aos dezassete.
Sabemos lá que a Vida é ruim!
A tudo amamos, tudo cremos.
Aos dezassete eu fui assim.
Depois, Acilda, os livros dizem,
Dizem os velhos, dizem todos:
«A Vida é triste! A Vida leva,
A um e um, todos os sonhos.»
Deixá-los lá falar os velhos,
Deixá-los lá… A Vida é ruim?
Aos vinte e seis eu amo, eu creio.
Aos vinte e seis eu sou assim.
In “Pelo Sonho é que Vamos”
Editora Ática
Sebastião da Gama
1924 – 1952
CABELOS BRANCOS
Cobrem-me as fontes já cabelos brancos,
Não vou a festas. E não vou, não vou.
Vou para a aldeia, com os meus tamancos,
Cuidar das hortas. E não vou, não vou.
Cabelos brancos, vá, sejamos francos,
Minha inocência quando os encontrou
Era um mistério vê-los: Tive espantos
Quando os achei, menino, em meu avô.
Nem caiu neve, nem vieram gelos:
Com a estranheza ingénua da mudança,
Castanhos remirava os meus cabelos;
E, atento à cor, sem ter outra lembrança,
Ruços cabelos me doía vê-los...
E fiquei sempre triste de criança.
In "Ossadas" – 1947
Afonso Duarte
1884 – 1958
NÃO ADORMEÇAS
Não adormeças: o vento ainda assobia no meu quarto
e a luz é fraca e treme e eu tenho medo
das sombras que desfilam pelas paredes como fantasmas
da casa e de tudo aquilo com que sonhes.
Não adormeças já. Diz-me outra vez do rio que palpitava
no coração da aldeia onde nasceste, da roupa que vinha
a cheirar a sonho e a musgo e ao trevo que nunca foi
de quatro folhas; e das ervas húmidas e chãs
com que em casa se cozinham perfumes que ainda hoje
te mordem os gestos e as palavras.
O meu corpo gela à míngua dos teus dedos, o sol vai
demorar-se a regressar. Há tempo para uma história
que eu não saiba e eu juro que, se não adormeceres,
serei tão leve que não hei-de pesar-te nunca na memória,
como na minha pesará para sempre a pedra do teu sono
se agora apenas me olhares de longe e adormeceres.
In “A Casa e o Cheiro dos Livros”
Edições Quetzal – 1996
Maria do Rosário Pedreira
N.1959
SETE LUAS
Há noites que são feitas dos meus braços
e um silêncio comum às violetas
e há sete luas que são sete traços
de sete noites que nunca foram feitas
Há noites que levamos à cintura
como um cinto de grandes borboletas.
E um risco a sangue na nossa carne escura
duma espada à bainha de um cometa.
Há noites que nos deixam para trás
enrolados no nosso desencanto
e cisnes brancos que só são iguais
à mais longínqua onda de seu canto.
Há noites que nos levam para onde
o fantasma de nós fica mais perto:
e é sempre a nossa voz que nos responde
e só o nosso nome estava certo.
Dimensão Encontrada – 1957
Edição da Autora
Natália Correia
1923 – 1993
SE POR NÃO ME LEMBRAR DE UM CROCODILO
Se por não me lembrar de um crocodilo,
Que matar-me intentou com falso pranto,
Pudera sujeitar-me a rigor tanto,
Que habitara com os mais no egípcio Nilo.
Se por não me acordar daquele estilo,
Que foi já por meu mal infausto encanto,
Pudera padecer, causando espanto,
Quantos tormentos inventou Perilo.
Tudo passara enfim, tudo fizera
Por não me vir jamais ao pensamento
Quem fingindo chorou, matou fingido.
Mas que raro tormento não quisera,
Quem julga só pelo maior tormento,
A lembrança menor de um fementido.
In "Antologia da Poesia do Período Barroco",
Moraes Editores, 1982 – Lisboa, Portugal.
Soror Violante do Céu
1602 – 1693
VEM VENTO, VARRE
Vem vento, varre
sonhos e mortos.
Vem vento, varre
medos e culpas.
Quer seja dia,
quer faça treva,
varre sem pena,
leva adiante
paz e sossego,
leva contigo
nocturnas preces,
presságios fúnebres,
pávidos rostos
só covardia.
Que fique apenas
erecto e duro
o tronco estreme
de raiz funda.
Leva a doçura,
se for preciso:
ao canto fundo
basta o que basta.
Vem vento, varre!
In “Noite Aberta Aos Quatro Ventos – Líricas Portuguesas”
Portugália Editora
Adolfo Casais Monteiro
1908 – 1972
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