Domingo, 31 de Julho de 2011

Recordando... António Manuel Couto Viana

MOIMENTO

 

Puseram a bandeira a meia-haste

E decretaram luto na cidade,

Responsos, coroas, círios – quanto baste

Para iludir a eternidade.

 

Teve o nome nas ruas, em moimentos:

«Nasceu – morreu – tantos de tal – Poeta»

Houve discursos graves, longos, lentos.

– Venham todos os ventos

Do planeta!

 

Rasguem bandeiras, sequem flores; no céu

Se percam orações, paters e glórias

– Tudo isso é dor que não lhe pertenceu – 

Destruam as estátuas e as memórias;

Que os discursos inúteis vão dispersos

 

– A  homenagem a um Poeta que morreu

É decorar-lhe os versos!

 

28 Setembro 49

 

In “As Folhas de Poesia Távola Redonda"

Fundação Calouste Gulbenkian

Boletim Cultural – Série VI – n.º 11 – Outubro de 1988

 

António Manuel Couto Viana

1923 – 2010  

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Segunda-feira, 25 de Julho de 2011

Recordando... José Blanc de Portugal

O VENTO LESTE

 

O vento leste soprou desabrido

sob o nítido Sol em céu imaculado.

 

Sobre pedras duras, entre casas altas

mosqueadas pelas injúrias de acrescentados anos,

o Caminhante faz por esquecer as próprias dores

com a esperança de um feliz encontro e,

estranhamente,

quanto mais intensa a dor

mais eficazmente lha mitiga

a esperança.

 

 

In “Quaresma Abreviada”

Black Sun Editores

 

José Blanc de Portugal

1914 – 2000

 

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Terça-feira, 19 de Julho de 2011

Recordando... A. Fernando Alves

RIO DOURO

 

Apesar de ser de Espanha

Sua beleza é tamanha

E já tem fama mundial.

Este rio tão dourado

Lembra o vinho afamado

Que enaltece Portugal.

 

Serpenteando entre serras

Vai fertilizando as terras,

Antes de ao Porto chegar.

Rio dos barcos rabelos

Gostava de voltar a vê-los

No Rio Douro a navegar.

 

Nas margens em que se espraia

Tem no Porto e em Gaia

Enamorados corações.

Muito embora separados

Vivem a ele abraçados

São duas grandes paixões.

 

Ao aproximar-se da Foz

Ele passa mais veloz

Em correria suicida.

Mas antes de entrar no mar

Há quem o veja acenar

Em jeito de despedida.

 

 

In “Jóia de Granito”

Edição do Autor

 

A. Fernando Alves

N. 1934

 

 

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Quarta-feira, 13 de Julho de 2011

Recordando... Virgínia Victorino

TRISTEZA


Nos dias de tristeza, quando alguém
Nos pergunta, baixinho, o que é que temos,
Às vezes, nem sequer nós respondemos:
Faz-nos mal a pergunta, em vez de bem.

Nos dias dolorosos e supremos,
Sabe-se lá donde a tristeza vem?!...
Calamo-nos. Pedimos que ninguém
Pergunte pelo mal de que sofremos...

Mas, quem é livre de contradições?!
Quem pode ler em nossos corações?!...
Ó mistério, que em toda parte existes...

Pois, haverá desgosto mais profundo
Do que este de não se ter alguém no mundo
Que nos pergunte por que estamos tristes?!

 

 

 

In “Namorados”

Portugália  Editora – 1924

 

Virgínia Victorino

1895 – 1968 

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Quinta-feira, 7 de Julho de 2011

Recordando... António Luís Moita

ACODE A NOITE…

 

Acode a noite, o dia se apagando.

A cidade impõe-se a outra face.

0 mistério, agora, é lírico e é brando.

Se a mão lhe toca, abre-se.

 

É noite funda.  Dos bas-fonds diversos

o som que vinha, lúbrico, morreu…

 

– É  Deus que assiste a dor de fazer versos.

Foi a minh’alma que se mereceu.

 

 

In “As Folhas de Poesia Távola Redonda"

Fundação Calouste Gulbenkian

Boletim Cultural – Série VI – n.º 11 – Outubro de 1988

 

António Luís Moita

N. 1925

 

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Sexta-feira, 1 de Julho de 2011

Recordando... Ana Hatherly

O ECO DE MIL SINOS DE PRATA

 

O eco de mil sinos de prata

       emudece

       ante o labor da aranha

 

       O tempo emudece

       na cegueira do ar

       na sua geografia nula

 

      Que queres de mim

      matéria insensível?

     

      Nas coisas conhecidas

      o verbo ser

      emudece

 

 

In “O Pavão Negro”

Editores Assírio & Alvim

 

Ana Hatherly

N. 1929

 

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