SONETO XVI
O louro chá no bule fumegando
De Mandarins e Brâmanes cercado;
Brilhante açúcar em torrões cortado;
O leite na caneca branquejando.
Vermelhas brasas, alvo pão tostado;
Ruiva manteiga em prato bem lavado;
O gado feminino rebanhado,
E o pisco Ganimedes apalpando;
A ponto a mesa está de enxaropar-nos.
Só falta que tu queiras, meu Sarmento,
Com teus discretos ditos alegrar-nos.
Se vens, ou caia chuva, ou brame o vento,
Não pode a longa noite enfastiar-nos,
Antes tudo será contentamento.
Obras Poéticas de Pedro António Correia Garção
In “Ler Por Gosto”
Areal Editores
Pedro António Correia Garção
1724 – 1772
À MORTE DE F.
Esse jasmim, que arminhos desacata,
Essa aurora, que nácares aviva,
Essa fonte, que aljôfares deriva,
Essa rosa, que púrpuras desata;
Troca em cinza voraz lustrosa prata,
Brota em pranto cruel púrpura viva,
Profana em turvo pez prata nativa,
Muda em luto infeliz tersa escarlata.
Jasmim na alvura foi, na luz Aurora,
Fonte na graça, rosa no atributo,
Essa heróica deidade que em luz repousa.
Porém fora melhor que assim não fora,
Pois a ser cinza, pranto, barro e luto,
Nasceo jasmim, aurora, fonte, rosa.
Fénix Renascida III
In “Ler Por Gosto”
Areal Editores
Francisco de Vasconcelos
1665 – 1723
SONETO
Amor, se uma mudança imaginada
É já com tal rigor minha homicida,
Que será se passar de ser temida,
A ser, como temida, averiguada?
Se só por ser de mim tão receada,
Com dura execução me tira a vida,
Que fará se chegar a ser sabida?
Que fará se passar de suspeitada?
Porém se já me mata, sendo incerta,
Somente imaginá-la e presumi-la,
Claro está (pois da vida o fio corta).
Que me fará depois, quando for certa,
Ou tornar a viver para senti-la,
Ou senti-la também depois de morta.
Rimas Várias
In “Breve Antologia Poética do Período Barroco”
Livª. Civilização Editora – Porto e Contexto Editora – Lisboa
Soror Violante do Céu
1602 – 1693
A UM PRADO FLORIDO
Do que sou me vi já mui diferente,
Alegre tu virás a estar de luto:
Qual te vejo, me vi com flor, e fruto,
Qual me vês, te verás bem descontente:
Dá-te agora tributo o estio ardente,
Eu ao frio inverno dou tributo,
Assim nos fez o tempo sempre astuto,
Se triste agora a mim, a ti florente:
Não queiras fazer certo o meu receio,
Pois tens exemplo em mim: Ah quem me dera,
Que em mim escarmentaras teus enganos!
Mas lá virá o tempo horrendo, e feio,
Donde perca seu brio a primavera,
E te sirvam de dor meus desenganos.
Fénix Renascida
In “Breve Antologia Poética do Período Barroco”
Livª. Civilização Editora – Porto e Contexto Editora – Lisboa
António Barbosa Bacelar
1610 – 1663
PENANDO AUSENTE E PRESENTE
Se a vossos olhas chego,
Se deles me desvio
Na dura ausência, e no suave emprego,
Um incêndio padeço, e choro um rio.
E sempre em tal pesar, e prazer tanto,
Se turva a vista em luz, se turva em pranto.
Ai como temo que me façam cego
De ver no gosto, e de não ver na mágoa
Vossos olhos em fogo, e os meus com água.
Fénix Renascida
In “Breve Antologia Poética do Período Barroco”
Livª. Civilização Editora – Porto e Contexto Editora – Lisboa
Frei Jerónimo Baía
1620/30 – 1688
QUEIXAM-SE TODOS OS DEFUNTOS,
QUE HOUVE NA EPIEMIA QUE
PADECEU LISBOA, NO ANO DE 1723
Nós, abaixo assinados pela terra,
clamamos, de que em tanta mortandade
não tenha entrado Médico, nem Frade;
e que só faça a morte aos pobres guerra!
Dirá a morte que pouco ou nada erra,
em desviar de toda a enfermidade
a dois que são da sua faculdade;
porque o Médico mata e o Frade enterra.
Replicamos: que as tumbas com frequências,
andam cá por estreitos pecadores,
sem subirem às largas consciências.
Dirá também que os tais são matadores;
e é preciso que tenha dependências
a morte com Ministros e Senhores.
In “Cem Poemas Portugueses do Riso e do Maldizer”
Selecção e org. de José Fanha e José Jorge Letria
Editora Terramar
Tomás Pinto Brandão
1664 – 1743
SIGNIFICAÇÕES DAS FLORES MORALIZADAS
NARCISO GENTILEZA
Tem o narciso tanta gentileza,
Que na fonte o rendeu sua beleza,
E hoje, porque o conte,
Há narciso do espelho, e não da fonte,
Homem, que sem conselho,
Como dama te alindas ao espelho,
Olha bem que só toca neste espaço
O cristal à mulher, a ti o aço,
Abraça o que te é próprio,
Que ser homem, e flor está impróprio,
Se és belo procede de tal arte,
Que quem te vê Narciso, te olha Marte.
In “Cem Poemas Portugueses no Feminino”
Selecção e org. de José Fanha e José Jorge Letria
Editora Terramar
Soror Maria do Céu
1658 – 1753
AS DUAS REGATEIRAS PELEJANDO
Clara e salva sejais, Clara Vicente!
Vedes tamanho mal? Que esta malvada
Tem língua e quer falar em gente honrada,
Sabendo vós quem é e de que gente.
Por isso o mundo vai de balravente!
Assim veja eu Brites bem casada,
Que em quanto disse e fala esta coitada
Com quantos tem na boca, todos mente.
Vós vedes, e quão má língua é de praga.
Ora, enfim, cada qual dá o que tem,
Por isso em mim não faz nem desfaz nada.
Que a que é boa e honrada não se apaga
Com ditos de uma suja, olhai de quem!
Louvado a Deus, sou bem casada!
Fénix Renascida
In “Breve Antologia Poética do Período Barroco”
Livª. Civilização Editora – Porto e Contexto Editora – Lisboa
D. Tomás de Noronha
? – 1651
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