Quinta-feira, 28 de Agosto de 2008

Recordando... Poetas Contemporâneos... Manuel Alegre

A FOICE E A PENA

 

 

Com outra que não pena arma trabalhas.

Se é minha a pena é tua a foice. Mas

se acaso são diferentes nossas armas

as penas são as mesmas e as batalhas.

 

Eu ceifo com a pena ervas daninhas

e a mentira que a todos envenena.

E tu ceifando penas essa pena

que fraterna se junta às penas minhas.

 

Onde tu ceifas eu ceifeiro sou

da tua dor ceifeira e dessas queixas

que dizes a ceifar e nunca ceifas.

 

Se já teu canto a foice te ceifou

canta ceifeira canta: a dor destrói-se

juntando a foice à pena e a pena à foice

 

 

 

In "O Canto e As Armas"

 

Manuel Alegre

N. 1936

 

 

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Domingo, 24 de Agosto de 2008

Recordando... Poetas Contemporâneos... Joaquim Pessoa

MEU AMOR QUE EU NÃO SEI

 

Meu amor que eu não sei. Amor que eu canto. Amor que eu digo.
Teus braços são a flor do aloendro.
Meu amor por quem parto. Por quem fico. Por quem vivo.
Teus olhos são da cor do sofrimento.

 

Amor-país.
Quero cantar-te. Como quem diz:

 

O nosso amor é sangue. É seiva. E sol. E primavera.
Amor intenso. Amor imenso. Amor instante.
O nosso amor é uma arma. E uma espera.
O nosso amor é um cavalo alucinante.

 

O nosso amor é um pássaro voando. Mas à toa.
Rasgando o céu azul-coragem de Lisboa,
Amor partindo. Amor sorrindo. Amor doendo.
O nosso amor é como a flor do aloendro.

 

Deixa-me soltar estas palavras amarradas
Para escrever com sangue o nome que inventei.
Romper. Ganhar a voz duma assentada.
Dizer de ti as coisas que eu não sei.
Amor. Amor. Amor. Amor de tudo ou nada.
Amor-verdade. Amor-cidade.
Amor-combate. Amor-abril.
Este amor de liberdade.

 

 

In "Amor Combate"

 

Joaquim Pessoa

N. 1948

 

 

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Quarta-feira, 20 de Agosto de 2008

Recordando... Poetas Contemporâneos... Gastão Cruz

ÁRVORES

 

São plátanos palmeiras castanheiros

jacarandás amendoeiras e até as

oliveiras que

quando a noite cai na infância formam uma

cortina escura na estrada frente à casa

árvores apagando os dias que a memória

avidamente esconde

 

no corpo do seu gémeo Penetra inutilmente

na terra essa raiz do branco plátano

adolescente

e o campo do tempo onde as palmeiras eram

pilares do corpo nu símbolo de

si mesmo, à luz

do dia fixo, já se estende

 

na húmida manhã dos castanheiros

Esquecimento que tudo enfim possuis

e geras

a ofuscante luz igual à da

memória, do tempo como ela

filho, construtor da ausência,

em vão te invoco Tu

 

que mudas a roxa amendoeira

em brancas flores do jacarandá

entrega a minha vida às árvores

que foram na manhã e no crepúsculo

no meio-dia e na noite, palavra

clara que traz o dia em si fechado

 

In “Crateras”

 

Gastão Cruz

N. 1941

 

 

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Sábado, 16 de Agosto de 2008

Recordando... Poetas Contemporâneos... António Manuel Couto Viana

 

A GALINHA ESPERTINHA

 

 

Era uma vez uma galinha

Que entrou pela cozinha,

Onde havia uma panela,

Mas sem nada dentro dela.

Ouviu, então,

A voz fraquinha do patrão

Dizendo à cozinheira:

- "Não se arranja

Por aí uma canja?

Estou cheio de fome."

Pôs a galinha um ovo e disse: - Come."

E fugiu sem demora,

Antes que lhe chegasse a derradeira hora.

 

In “Versos de Palmo e Meio”

 

António Manuel Couto Viana

N. 1923

 

 

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Terça-feira, 12 de Agosto de 2008

Recordando... Poetas Contemporâneos... Ruy Belo

E TUDO ERA POSSÍVEL

 

Na minha juventude antes de ter saído
da casa de meus pais disposto a viajar
eu conhecia já o rebentar do mar
das páginas dos livros que já tinha lido

 

Chegava o mês de maio era tudo florido
o rolo das manhãs punha-se a circular
e era só ouvir o sonhador falar
da vida como se ela houvesse acontecido

 

E tudo se passava numa outra vida
e havia para as coisas sempre uma saída
Quando foi isso? Eu próprio não o sei dizer

 

Só sei que tinha o poder duma criança
entre as coisas e mim havia vizinhança
e tudo era possível era só querer


In “Homem de Palavra(s)”
Editorial Presença

 

Ruy Belo

1933 – 1978

 

 

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Sexta-feira, 8 de Agosto de 2008

Recordando... Poetas Contemporâneos... Matilde Rosa Araújo

BALADA DAS VINTE MENINAS

 

Vinte meninas, não mais,
Eu via ali no beiral:
Tinham cabecinha preta
E branquinho o avental.

Vinte meninas, não mais,
Eu via naquele muro:
Tinham cabecinha preta,
Vestidinho azul-escuro.

As minhas vinte meninas,
Capinhas dizendo adeus,
Chegaram na Primavera
E acenaram lá dos céus.

As minhas vinte meninas
Dormiam quentes num ninho
Feito de amor e de terra,
Feito de lama e carinho.

As minhas vinte meninas
Para o almoço e o jantar
Tinham coisas pequeninas,
Que apanhavam pelo ar.

Já passou a Primavera
Suas horas pequeninas:
E houve um milagre nos ninhos.
Pois foram mães, as meninas!

Eram ovos redondinhos
Que apetecia beijar:
Ovos que continham vidas
E asinhas para voar.

Já não são vinte meninas
Que a luz do Sol acalenta.
São muitas mais! muitas mais!
Não são vinte, são oitenta!

Depois oitenta meninas
Eu via ali no beiral:
Tinham cabecinha preta
E branquinho o avental.

Mas as oitenta meninas,
Capinhas dizendo adeus,
Em certo dia de Outono
Perderam-se pelos céus.

 

In “Verso Aqui Verso Acolá” (organização de Natércia Rocha)

 

Matilde Rosa Araújo

N. 1921

 

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Segunda-feira, 4 de Agosto de 2008

Recordando... Poetas Contemporâneos... Albano Martins

ALEGORIA

Segunda

De poetas
e filósofos tu sabes,
sabes também por ti. Por isso eu digo:
esta pedra é vermelha, esta pedra é sangue.
Toca-lhe: saberás
como em segredo florescem as acácias
ao redor dos muros, como fluem
suas concêntricas artérias. Acaricia-as: tocas
a parte mais sensível de ti mesmo.
Dizias ontem
que o verão ardia
nesta pedra. Nela
queimavas tuas mãos. Onde
as aqueces hoje? Eu digo:
o verão não morreu, esta pedra é o verão.
E tudo permanece.
E tudo é teu.
Tu és o sangue, o verão e a pedra.

In ”Paralelo Ao Vento” – 1979

 

Albano Martins

N. 1930

 

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