DÁDIVA DIVINA
Como é grande o valor da Natureza
E tudo quanto a Mão de Deus criou…
O mais pequeno ser, nos dá certeza
Da grandeza divina que o moldou!...
Obra de maravilha e de Beleza,
Grande foi o Amor que a inspirou…
Toda da Obra de Deus é chama acesa
Que a Natureza Mãe, eternizou!...
E dessa Obra prima, de esplendores:
Nasceram rios, árvores e flores,
Aves, astros e coisas divinais!...
Mas de tanta grandeza concebida
Com que Deus quis dar vida à própria Vida:
– Ter nascido Poeta, é muito mais!
In “Esta Cidade Que Eu Amo” – 1985
Castro Reis
1918 – 2007
NA PRAIA LÁ DA BOA NOVA
Na praia lá da Boa Nova, um dia,
Edifiquei (foi esse o grande mal)
Alto castelo, o que é a fantasia,
Todo de lápis-lazúli e coral!
Naquelas redondezas não havia
Quem se gabasse dum domínio igual:
Oh, castelo tão alto! parecia
O território dum senhor feudal!
Um dia (não sei quando, nem sei donde)
Um vento seco de deserto e spleen
Deitou por terra, ao pó que tudo esconde,
O meu condado, o meu condado, sim!
Porque eu já fui um poderoso conde,
Naquela idade em que se é conde assim…
Porto, 1887
In “SÓ” – Sonetos – 3
Estante Editora
António Nobre
1867 – 1900
CARTA ABERTA
Diante de ti, que tens fome
ou tremes de cansaço,
perdoa, irmão,
que eu tenha de sofrer
um drama que parece de palavras!
Semeio versos,
tu moirejas nas cavas,
regando a terra com o suor do rosto
e requeimas a carne à boca das fornalhas
e gastas a paciência,
vivendo ao ritmo inumano das máquinas
(eu, é da alma que suo...)
Não é vida este sonho a que me espelho?
Não me dou como tu?
Irmão, perdoa!
Não fui eu quem talhou o meu destino
e a sede de me ser também é inferno!
Irmão, perdoa!
Não feches o teu punho a esta mão sem calos...
Outros, mas também tenho os meus trabalhos:
é com o cerne dos meus nervos
que acendo este luzeiro do meu canto.
Se me não vês assim,
se te pareço, ao rumo dos teus passos,
o passo inútil duma lua inquieta
num céu fechado,
ou apenas um mocho (agoirento e romântico),
não me fuzile a tua voz de pragas!
Não me chames Poeta
como quem cospe um exorcismo!
Sou teu longínquo irmão,
irmão!
Como tu deserdado
e à espera do mesmo:
sete palmos de terra e de silêncio...
In “Terra ao Mar” – Editorial Inquérito, 1954
António de Sousa
1898 – 1981
FADO
Porque é que adeus me disseste
Ontem e não noutro dia,
Se os beijos que, ontem, me deste
Deixaram a noite fria?
Para quê voltar atrás
A uma esperança perdida?
As horas boas são más
Quando chega a despedida.
Meu coração já não sente.
Sei lá bem se já te vi!
Lembro-me de tanta gente
Que nem me lembro de ti.
Quem és tu que mal existes?
Entre nós, tudo acabou.
Mas pelos meus olhos tristes
Poderás saber quem sou!
Fandangueiro
In “Poesias Escolhidas” – Lisboa – INCM – 1983
Pedro Homem de Mello
1904 – 1984
NESSE TEMPO PARA MIM
Nesse tempo para mim
amar era trazer uma fogueira
onde colava um rosto de mulher
ou a forma de um jasmim.
De vez em quando vestia-lhe um fantasma novo
ou outro sonho qualquer,
ás vezes bastava mudar-lhe o nome
pronunciado com a saliva das manhãs rumorosas
de quem tem sede
não de uma fonte especial,
mas apenas do orvalho
que o Sol ao nascer
modela no perfume-seda
das rosas.
In “Poeta Militante”
Publicações D. Quixote
José Gomes Ferreira
1900 – 1985
TOADA PARA AS MÃES ACALENTAREM OS FILHOS
Ó Desgraça! Vai-te embora,
Que esta linda criancinha
Andou no meu ventre e agora
Trago-a nos braços. É minha!…
Do berço, segue-me os passos;
Onde eu vou, seus olhos vão…
E quando a aperto nos braços
– Abraço o meu coração.
Quando o seu choro receio,
Embalo-a, faço que aceite
A alegria do meu seio
Na brancura do meu leite…
E quando assim não descansa,
Que tristezas me consomem!
– Mas antes chore
Que
Se ao dá-lo ao mundo sofri
Tormentos, ânsias mortais,
Desgraça, vai-te de aqui,
O que pretendes tu mais!?
Bate as asas, mas ao voares
Não me apagues esta estrela.
Se alguém de aqui precisares,
– Aqui me tens, em vez dela.
Tocam às ave-marias.
Foi-se o sol. Não vem a lua.
Luzinha que me alumias,
Que sorte será a tua?…
Riquezas tenhas tão grandes,
E tal bondade também,
Que ao redor donde tu andes
Não fique pobre ninguém.
Que a todos chegue a ventura:
Toda a boca tenha pão,
Toda a nudez cobertura,
Toda a dor, consolação…
Mas se o oiro é mau caminho,
– Antes tu venhas a ser
O pobre mais pobrezinho
De quantos pobres houver.
Iremos por esses montes
Altos e azuis como os céus…
Que onde há frutos e onde há fontes,
– Está a mesa de Deus!
E, quando a neve cair
E as seivas adormecerem,
Iremos então pedir…
(Aceitar o que nos derem!)
Andaremos à mercê
Dos génios bons e dos falsos,
Léguas e léguas a pé,
Rotinhos, magros, descalços…
E onde houver urzes e tojos,
Pedras que rasgam a pele,
Porei o corpo de rojos
– Passarás por cima dele!
Dorme, dorme, meu menino,
Foi-se o sol. Nasceu a lua.
Qual será o teu destino?
Que sorte será a tua?…
Se um crime tens de fazer,
Antes fique vago um trono,
Antes um palácio a arder,
Do que uma enxada sem dono…
Se, porém, no teu destino,
Há tão cruentos sinais,
Dorme, dorme, meu menino,
– Não tornes a acordar mais!…
In “Luar de Janeiro”
Colecção – Autores Portugueses de Ontem – 1989
Estante Editora
Augusto Gil
1873 – 1929
NÃO ÉS TU
Era assim, tinha esse olhar,
A mesma graça, o mesmo ar,
Corava da mesma cor,
Aquela visão que eu vi
Quando eu sonhava de amor,
Quando em sonhos me perdi.
Toda assim; o porte altivo,
O semblante pensativo,
E uma suave tristeza
Que por toda ela descia
Como um véu que lhe envolvia,
Que lhe adoçava a beleza.
Era assim; o seu falar,
Ingénuo e quase vulgar,
Tinha o poder da razão
Que penetra, não seduz;
Não era fogo, era luz
Que mandava ao coração.
Nos olhos tinha esse lume,
No seio o mesmo perfume ,
Um cheiro a rosas celestes,
Rosas brancas, puras, finas,
Viçosas como boninas,
Singelas sem ser agrestes.
Mas não és tu... ai!, não és:
Toda a ilusão se desfez.
Não és aquela que eu vi,
Não és a mesma visão,
Que essa tinha coração,
Tinha, que eu bem lho senti.
In “Folhas Caídas – Livro Primeiro”
Almeida Garrett
1799 – 1854
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