HINO AO PORTO
Cidade em que as burguesas vão à missa
Vestidas de vermelho carmesim.
Em vão, a luz, sobre elas, se espreguiça...
(As mães, pelo caminho, ao vir da missa
Proíbem-lhes os bancos do jardim...)
Não há fidalgos hoje. Há comerciantes.
É deles todo o ar que se respira!
Noites sem flor, sem luz, sem estudantes
E sem guitarras e sem mentira!
Para sentir o mar, o rio eterno
Cava, connosco, a rocha que dormia
E deita-se connosco, na alegria
De imaginar o céu, calcando o inferno.
Na rua escura as lojas de oiro e pano
São pedras frias, frígidas mas quietas.
Ó frios mercadores de oiro e pano
Porto! Mercado frio e desumano...
E no entanto ali é que há Poetas!
Lutar! – é o verbo. – Não morrer – é a vida.
Mas em surgindo a morte, que na estrada
Os ombros verguem sob a urna pesada
E seja lenta a hora da partida!
Noites sem luz, sem mel, sem fantasia!
Noites sem estudantes e sem flor!
Porto! – cidade pulmonar e fria
Que tens a força de negar ao dia
A medicina do amor!
In “Bodas Vermelhas”
Porto Editora – 1979 – 3.ª edição
Pedro Homem de Mello
1904 – 1984
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