Quarta-feira, 7 de Fevereiro de 2018

Recordando... Emanuel Félix

FANTASIA

 

Oh mãe, conta-me histórias de encantar

Daquelas em que há príncipes e fadas,

Dragões que guardam torres encantadas,

E que contavas para me embalar.

 

Conta-me histórias, mãe! Lendas infindas

De castelos erguidos nas colinas,

Onde habitavam fadas e meninas,

Brancas e loiras, sempre muito lindas.

 

Mãe, conta-me histórias de encantar,

Dos anjos que no azul do céu voavam,

Dos lagos onde cisnes passeavam,

E que eu revia à luz do teu olhar.

 

Conta-me histórias como em pequenino

Me contavas e tudo me sorria.

Histórias lindas que eu atento ouvia...

Oh que saudades, mãe, de ser menino.

 

In "A Mãe na Poesia Portuguesa"

Antologia de Albano Martins

 

Emanuel Félix

(1936-2004)

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Segunda-feira, 30 de Novembro de 2015

Recordando... Emanuel Félix

FIVE O'CLOCK TEAR

 

Coisa tão triste aqui esta mulher

com seus dedos pousados no deserto dos joelhos

com seus olhos voando devagar sobre a mesa

para pousar no talher

Coisa mais triste o seu vaivém macio

p'ra não amachucar uma invisível flora

que cresce na penumbra

dos velhos corredores desta casa onde mora

 

Que triste o seu entrar de novo nesta sala

que triste a sua chávena

e o gesto de pegá-la

 

E que triste e que triste a cadeira amarela

de onde se ergue um sossego um sossego infinito

que é apenas de vê-la

e por isso esquisito

 

E que tristes de súbito os seus pés nos sapatos

seus seios seus cabelos o seu corpo inclinado

o álbum a mesinha as manchas dos retratos

 

E que infinitamente triste triste

o selo do silêncio

do silêncio colado ao papel das paredes

da sala digo cela

em que comigo a vedes

 

Mas que infinitamente ainda mais triste triste

a chávena pousada

e o olhar confortando uma flor já esquecida

do sol

do ar

lá de fora

(da vida)

numa jarra parada

 

In “A Palavra o Açoite”

Centelha Editora – 1984

 

Emanuel Félix

(1936- 2004)

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Domingo, 30 de Novembro de 2014

Recordando... Emanuel Félix

AS RAPARIGAS LÁ DE CASA

 

Como eu amei as raparigas lá de casa

 

discretas fabricantes da penumbra

guardavam o meu sono como se guardassem

o meu sonho

repetiam comigo as primeiras palavras

como se repetissem os meus versos

povoavam o silêncio da casa

anulando o chão os pés as portas por onde

saíam

deixando sempre um rastro de hortelã

traziam a manhã

cada manhã

o cheiro do pão fresco da humidade da terra

do leite acabado de ordenhar

 

(se voltassem a passar todas juntas agora

veríeis como ficava no ar o odor doce e materno

das manadas quando passam)

aproximavam-se as raparigas lá de casa

e eu escutava a inquieta maresia

dos seus corpos

umas vezes duros e frios como seixos

outras vezes tépidos como o interior dos frutos

no outono

penteavam-me

e as suas mãos eram leves e frescas como as folhas

na primavera

 

não me lembro da cor dos olhos quando olhava

os olhos das raparigas lá de casa

mas sei que era neles que se acendia

o sol

ou se agitava a superfície dos lagos

do jardim com lagos a que me levavam de mãos dadas

as raparigas lá de casa

que tinham namorados e com eles

traíam

a nossa indefinível cumplicidade

 

eu perdoava sempre e ainda agora perdoo

às raparigas lá de casa

porque sabia e sei que apenas o faziam

por ser esse o lado mau de sua inexplicável bondade

o vício da virtude da sua imensa ternura

da ternura inefável do meu primeiro amor

do meu amor pelas raparigas lá de casa

 

Habitação das Chuvas          

 

In “121 Poemas Escolhidos”

Editor Salamandra

 

Emanuel Félix

1936 – 2004

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Terça-feira, 17 de Agosto de 2010

Recordando... Emanuel Félix

AS RAPARIGAS LÁ DE CASA

Como eu amei as raparigas lá de casa

discretas fabricantes da penumbra
guardavam o meu sono como se guardassem
o meu sonho
repetiam comigo as primeiras palavras
como se repetissem os meus versos
povoavam o silêncio da casa
anulando o chão os pés as portas por onde
saíam
deixando sempre um rastro de hortelã
traziam a manhã
cada manhã
o cheiro do pão fresco da humidade da terra
do leite acabado de ordenhar

(se voltassem a passar todas juntas agora
veríeis como ficava no ar o odor doce e materno
das manadas quando passam)

aproximavam-se as raparigas lá de casa
e eu escutava a inquieta maresia
dos seus corpos
umas vezes duros e frios como seixos
outras vezes tépidos como o interior dos frutos
no outono
penteavam-me
e as suas mãos eram leves e frescas como as folhas
na primavera

não me lembro da cor dos olhos quando olhava
os olhos das raparigas lá de casa
mas sei que era neles que se acendia
o sol
ou se agitava a superfície dos lagos
do jardim com lagos a que me levavam de mãos dadas
as raparigas lá de casa
que tinham namorados e com eles
traíam
a nossa indefinível cumplicidade

eu perdoava sempre e ainda agora perdoo
às raparigas lá de casa
porque sabia e sei que apenas o faziam
por ser esse o lado mau de sua inexplicável bondade
o vício da virtude da sua imensa ternura
da ternura inefável do meu primeiro amor
do meu amor pelas raparigas lá de casa

 

 

In “Habitação das Chuvas”

Angra do Heroísmo – 1997  

 

Emanuel Félix

1936 – 2004

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | ler comentários (1) | favorito

.Eu

.pesquisar

 

.Março 2024

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
14
15
16
17
18
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31

.Ano XVI

.posts recentes

. Recordando... Emanuel Fél...

. Recordando... Emanuel Fél...

. Recordando... Emanuel Fél...

. Recordando... Emanuel Fél...

.arquivos

. Março 2024

. Fevereiro 2024

. Janeiro 2024

. Dezembro 2023

. Novembro 2023

. Outubro 2023

. Setembro 2023

. Agosto 2023

. Julho 2023

. Junho 2023

. Maio 2023

. Abril 2023

. Março 2023

. Fevereiro 2023

. Janeiro 2023

. Dezembro 2022

. Novembro 2022

. Outubro 2022

. Setembro 2022

. Agosto 2022

. Julho 2022

. Junho 2022

. Maio 2022

. Abril 2022

. Março 2022

. Fevereiro 2022

. Janeiro 2022

. Dezembro 2021

. Novembro 2021

. Outubro 2021

. Setembro 2021

. Agosto 2021

. Julho 2021

. Junho 2021

. Maio 2021

. Abril 2021

. Março 2021

. Fevereiro 2021

. Janeiro 2021

. Dezembro 2020

. Novembro 2020

. Outubro 2020

. Setembro 2020

. Agosto 2020

. Julho 2020

. Junho 2020

. Maio 2020

. Abril 2020

. Março 2020

. Fevereiro 2020

. Janeiro 2020

. Dezembro 2019

. Novembro 2019

. Outubro 2019

. Setembro 2019

. Agosto 2019

. Julho 2019

. Junho 2019

. Maio 2019

. Abril 2019

. Março 2019

. Fevereiro 2019

. Janeiro 2019

. Dezembro 2018

. Novembro 2018

. Outubro 2018

. Setembro 2018

. Agosto 2018

. Julho 2018

. Junho 2018

. Maio 2018

. Abril 2018

. Março 2018

. Fevereiro 2018

. Janeiro 2018

. Dezembro 2017

. Novembro 2017

. Outubro 2017

. Setembro 2017

. Agosto 2017

. Julho 2017

. Junho 2017

. Maio 2017

. Abril 2017

. Março 2017

. Fevereiro 2017

. Janeiro 2017

. Dezembro 2016

. Novembro 2016

. Outubro 2016

. Setembro 2016

. Agosto 2016

. Julho 2016

. Junho 2016

. Maio 2016

. Abril 2016

. Março 2016

. Fevereiro 2016

. Janeiro 2016

. Dezembro 2015

. Novembro 2015

. Outubro 2015

. Setembro 2015

. Agosto 2015

. Julho 2015

. Junho 2015

. Maio 2015

. Abril 2015

. Março 2015

. Fevereiro 2015

. Janeiro 2015

. Dezembro 2014

. Novembro 2014

. Outubro 2014

. Setembro 2014

. Agosto 2014

. Julho 2014

. Junho 2014

. Maio 2014

. Abril 2014

. Março 2014

. Fevereiro 2014

. Janeiro 2014

. Dezembro 2013

. Novembro 2013

. Outubro 2013

. Setembro 2013

. Agosto 2013

. Julho 2013

. Junho 2013

. Maio 2013

. Abril 2013

. Março 2013

. Fevereiro 2013

. Janeiro 2013

. Dezembro 2012

. Novembro 2012

. Outubro 2012

. Setembro 2012

. Agosto 2012

. Julho 2012

. Junho 2012

. Maio 2012

. Abril 2012

. Março 2012

. Fevereiro 2012

. Janeiro 2012

. Dezembro 2011

. Novembro 2011

. Outubro 2011

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

. Abril 2010

. Março 2010

. Fevereiro 2010

. Janeiro 2010

. Dezembro 2009

. Novembro 2009

. Outubro 2009

. Setembro 2009

. Agosto 2009

. Julho 2009

. Junho 2009

. Maio 2009

. Abril 2009

. Março 2009

. Fevereiro 2009

. Janeiro 2009

. Dezembro 2008

. Novembro 2008

. Outubro 2008

. Setembro 2008

. Agosto 2008

. Julho 2008

. Junho 2008

. Maio 2008

. Abril 2008

. Março 2008

. Fevereiro 2008

. Janeiro 2008

. Dezembro 2007

. Novembro 2007

. Outubro 2007

. Setembro 2007

. Agosto 2007

. Julho 2007

. Junho 2007

. Maio 2007

. Abril 2007

.tags

. todas as tags

blogs SAPO

.subscrever feeds