Terça-feira, 25 de Julho de 2023

Recordando... António Luís Moita

DESPEDIDA

 

                   À memória do Sebastião da Gama

 

Feridas por mistério, emudeceram

todas as vozes, quando se quebrou

a amarra de navio que te prendia.

À beira cais alaram-se gaivotas

e o nevoeiro, após, tudo envolveu.

 

«Que é de ti, meu amor?» – e os olhos dela

repetiam, brilhando: «Que é de ti?».

No sorriso sem fim da tua boca

a memória do amor existiria?

 

Quase a teus pés choravam duas velas,

exaustas, já desfeitas, desoladas...

E as tuas mãos, longínquas e cruzadas.

extinguiam-se com elas.

 

Fevereiro de 52.

 

In “ÁRVORE ”

Folhas de Poesia

Direcção e Edição de António Luís Moita, António Ramos Rosa,

José Terra, Luís Amaro, Raul de Carvalho

2.° Fascículo - Inverno ele 1951-52

Pág. 90

 

António Luís Moita

(1925-2013)

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Terça-feira, 25 de Outubro de 2022

Recordando... António Luís Moita

CONCEITO PEQUENINO

 

A tudo se empresta aroma.

De tudo aroma se extrai.

O trigo que o homem sonha

Precede, vivo, o trigal.

 

Nasce o trigo e cresce o pão

Que no sonho se transforma.

Só com raízes no chão

Tem asas livres o homem.

 

In “Cidade Sem Tempo”

Lisboa – 1985 – Edição do Autor

 

António Luís Moita

(1925-2013)

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Terça-feira, 19 de Março de 2013

Recordando... António Luís Moita

EXÍLIO

 

Moramos a milhões de versos-luz
da mais próxima estrela. Que buscamos
na carne provisória que nos damos
senão este pavor dos ossos nus?

Entre rápidas rosas que anoitecem
e pássaros que tombam e navios
que em vão lançam as âncoras nos rios
e vão morrer no mar a que pertencem,
erguemos pontes, deuses, mitos, casas,
um verso que nem perto se decora.

– Quem nos deu sonho e asas
calou-se. Foi-se embora.

 

 

In “Cidade Sem Tempo”

Edição  do Autor – 1985 

 

António Luís Moita

N. 1925

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | ler comentários (2) | favorito
Sábado, 13 de Outubro de 2012

Recordando... António Luís Moita

FÓSSIL

 

As arestas da pedra são redondas
na mão desprevenida que as recebe
evaporadas, gastas pelas ondas
milenárias da praia que amanhece.

Mas são arestas quando, além da polpa
dos dedos mornos, outros dedos frios
aram na pedra o que na pedra é sombra,
numa cadência grave de navios.

Que mar antigo se dilata dentro
do fóssil mudo que já foi bivalve
e surge, aos olhos, coração cinzento,
sedento de uma nova humanidade?

Oiço-lhe o longo, longo chamamento...

– E, de repente, a pedra liquefaz-se.

 

 

In “Cidade Sem Tempo”

Edição do Autor – Lisboa – 1985

 

António Luís Moita

N. 1925

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Quinta-feira, 7 de Julho de 2011

Recordando... António Luís Moita

ACODE A NOITE…

 

Acode a noite, o dia se apagando.

A cidade impõe-se a outra face.

0 mistério, agora, é lírico e é brando.

Se a mão lhe toca, abre-se.

 

É noite funda.  Dos bas-fonds diversos

o som que vinha, lúbrico, morreu…

 

– É  Deus que assiste a dor de fazer versos.

Foi a minh’alma que se mereceu.

 

 

In “As Folhas de Poesia Távola Redonda"

Fundação Calouste Gulbenkian

Boletim Cultural – Série VI – n.º 11 – Outubro de 1988

 

António Luís Moita

N. 1925

 

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | ler comentários (1) | favorito
Quinta-feira, 25 de Novembro de 2010

Recordando... António Luís Moita

TUMULAR

 

Uma laje cinzenta nos separa
e dois metros de terra.

Tu, aí, és a paz.
Eu, aqui, sou a guerra.

Trago-te cravos, simples cravos brancos.
Cravos mais leves do que uma oração.
Sem a mácula seca das palavras
desfiadas em vão.

Sobre a laje os deponho, os distribuo
ao longo do que, certo, já não és:
ali, teus olhos líquidos e fundos;
aqui teu coração; além, teus pés.

Recolho então as flores decapitadas.
Amarro-as ao meu peito, a tudo o que vivi,
e regresso contigo à cidade habitada.

Tu, aí, és a paz: não precisas de nada.
Eu, aqui, sou a guerra: e preciso de ti.

 

 

In “Cidade Sem Tempo”

Edição do Autor – Lisboa  – 1985

 

António Luís Moita

N. 1925

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | ler comentários (1) | favorito

.Eu

.pesquisar

 

.Março 2024

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
14
15
16
17
18
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31

.Ano XVI

.posts recentes

. Recordando... António Luí...

. Recordando... António Luí...

. Recordando... António Luí...

. Recordando... António Luí...

. Recordando... António Luí...

. Recordando... António Luí...

.arquivos

. Março 2024

. Fevereiro 2024

. Janeiro 2024

. Dezembro 2023

. Novembro 2023

. Outubro 2023

. Setembro 2023

. Agosto 2023

. Julho 2023

. Junho 2023

. Maio 2023

. Abril 2023

. Março 2023

. Fevereiro 2023

. Janeiro 2023

. Dezembro 2022

. Novembro 2022

. Outubro 2022

. Setembro 2022

. Agosto 2022

. Julho 2022

. Junho 2022

. Maio 2022

. Abril 2022

. Março 2022

. Fevereiro 2022

. Janeiro 2022

. Dezembro 2021

. Novembro 2021

. Outubro 2021

. Setembro 2021

. Agosto 2021

. Julho 2021

. Junho 2021

. Maio 2021

. Abril 2021

. Março 2021

. Fevereiro 2021

. Janeiro 2021

. Dezembro 2020

. Novembro 2020

. Outubro 2020

. Setembro 2020

. Agosto 2020

. Julho 2020

. Junho 2020

. Maio 2020

. Abril 2020

. Março 2020

. Fevereiro 2020

. Janeiro 2020

. Dezembro 2019

. Novembro 2019

. Outubro 2019

. Setembro 2019

. Agosto 2019

. Julho 2019

. Junho 2019

. Maio 2019

. Abril 2019

. Março 2019

. Fevereiro 2019

. Janeiro 2019

. Dezembro 2018

. Novembro 2018

. Outubro 2018

. Setembro 2018

. Agosto 2018

. Julho 2018

. Junho 2018

. Maio 2018

. Abril 2018

. Março 2018

. Fevereiro 2018

. Janeiro 2018

. Dezembro 2017

. Novembro 2017

. Outubro 2017

. Setembro 2017

. Agosto 2017

. Julho 2017

. Junho 2017

. Maio 2017

. Abril 2017

. Março 2017

. Fevereiro 2017

. Janeiro 2017

. Dezembro 2016

. Novembro 2016

. Outubro 2016

. Setembro 2016

. Agosto 2016

. Julho 2016

. Junho 2016

. Maio 2016

. Abril 2016

. Março 2016

. Fevereiro 2016

. Janeiro 2016

. Dezembro 2015

. Novembro 2015

. Outubro 2015

. Setembro 2015

. Agosto 2015

. Julho 2015

. Junho 2015

. Maio 2015

. Abril 2015

. Março 2015

. Fevereiro 2015

. Janeiro 2015

. Dezembro 2014

. Novembro 2014

. Outubro 2014

. Setembro 2014

. Agosto 2014

. Julho 2014

. Junho 2014

. Maio 2014

. Abril 2014

. Março 2014

. Fevereiro 2014

. Janeiro 2014

. Dezembro 2013

. Novembro 2013

. Outubro 2013

. Setembro 2013

. Agosto 2013

. Julho 2013

. Junho 2013

. Maio 2013

. Abril 2013

. Março 2013

. Fevereiro 2013

. Janeiro 2013

. Dezembro 2012

. Novembro 2012

. Outubro 2012

. Setembro 2012

. Agosto 2012

. Julho 2012

. Junho 2012

. Maio 2012

. Abril 2012

. Março 2012

. Fevereiro 2012

. Janeiro 2012

. Dezembro 2011

. Novembro 2011

. Outubro 2011

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

. Abril 2010

. Março 2010

. Fevereiro 2010

. Janeiro 2010

. Dezembro 2009

. Novembro 2009

. Outubro 2009

. Setembro 2009

. Agosto 2009

. Julho 2009

. Junho 2009

. Maio 2009

. Abril 2009

. Março 2009

. Fevereiro 2009

. Janeiro 2009

. Dezembro 2008

. Novembro 2008

. Outubro 2008

. Setembro 2008

. Agosto 2008

. Julho 2008

. Junho 2008

. Maio 2008

. Abril 2008

. Março 2008

. Fevereiro 2008

. Janeiro 2008

. Dezembro 2007

. Novembro 2007

. Outubro 2007

. Setembro 2007

. Agosto 2007

. Julho 2007

. Junho 2007

. Maio 2007

. Abril 2007

.tags

. todas as tags

blogs SAPO

.subscrever feeds