Domingo, 30 de Junho de 2013

Recordando... Ricardo Reis/Fernando Pessoa

UNS

 

Uns, com os olhos postos no passado,

Vêem o que não vêem: outros, fitos

Os mesmos olhos no futuro, vêem

O que não pode ver-se.

 

Por que tão longe ir pôr o que está perto —

A segurança nossa? Este é o dia, 

Esta é a hora, este o momento, isto 

É quem somos, e é tudo.

 

Perene flui a interminável hora

Que nos confessa nulos. No mesmo hausto

Em que vivemos, morreremos. Colhe 

O dia, porque és ele.

 

Odes de Ricardo Reis

 

In “Fernando Pessoa – Antologia Poética”

3ª. Edição – Biblioteca Ulisses de Autores Portugueses

Editora Ulisses

 

Ricardo Reis/Fernando Pessoa

1887 – 1935

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Terça-feira, 25 de Junho de 2013

Recordando... Fernando Pessoa

NÃO MEU, NÃO MEU É QUANTO ESCREVO

 

Não meu, não meu é quanto escrevo.

A quem o devo?

De quem sou o arauto nado?

Por que, enganado,

Julguei ser meu o que era meu?

Que outro mo deu?

Mas, seja como for, se a sorte

For eu ser morte

De uma outra vida que em mim vive,

Eu, o que estive

Em ilusão toda esta vida

Aparecida,

Sou grato Ao que do pó que sou

Me levantou.

(E me fez nuvem um momento

De pensamento.)

(Ao que de quem sou, erguido pó,

Símbolo só.)

 

Cancioneiro

 

In “Fernando Pessoa – Antologia Poética”

3ª. Edição – Biblioteca Ulisses de Autores Portugueses

Editora Ulisses

 

Fernando Pessoa

1888 – 1935

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Quarta-feira, 19 de Junho de 2013

Recordando... Alberto Caeiro/Fernando Pessoa

O TEJO É MAIS BELO

 

O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,

Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia

Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia.

 

O Tejo tem grandes navios

E navega nele ainda,

Para aqueles que vêem em tudo o que lá não está,

A memória das naus.

 

O Tejo desce de Espanha

E o Tejo entra no mar em Portugal. 

Toda a gente sabe isso.

Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia

E para onde ele vai

E donde ele vem.

E por isso, porque pertence a menos gente, 

É mais livre e maior o rio da minha aldeia.  

 

Pelo Tejo vai-se para o Mundo.

Para além do Tejo há a América

E a fortuna daqueles que a encontram.  

Ninguém nunca pensou no que há para além

Do rio da minha aldeia.

 

O rio da minha aldeia não faz pensar em nada.  

Quem está ao pé dele está só ao pé dele.

 

XX - O Guardador de Rebanhos

 

In “Fernando Pessoa – Antologia Poética” – 3ª. Edição

Biblioteca Ulisses de Autores Portugueses

Editora Ulisses

 

Alberto Caeiro/Fernando Pessoa

1889 – 1915

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Quinta-feira, 13 de Junho de 2013

Recordando... Fernando Pessoa

ENTRE O LUAR E A FOLHAGEM

 

Entre o luar e a folhagem, 

Entre o sossego e o arvoredo,

Entre o ser noite e haver aragem

Passa um segredo.

Segue-o minha alma na passagem.

 

Ténue lembrança ou saudade,

Princípio ou fim do que não foi, 

Não tem lugar, não tem verdade,

Atrai e dói.

Segue-o meu ser em liberdade.

 

Vazio encanto ébrio de si,

Tristeza ou alegria o traz?

O que sou dele a quem sorri?

Nada é nem faz.

Só de segui-lo me perdi.

 

Cancioneiro

 

In “Fernando Pessoa – Antologia Poética”

3ª. Edição – Biblioteca Ulisses de Autores Portugueses

Editora Ulisses

 

Fernando Pessoa

1888 – 1935

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | ler comentários (1) | favorito
Sexta-feira, 7 de Junho de 2013

Recordando... Álvaro de Campos/Fernando Pessoa

APONTAMENTO

 

A minha alma partiu-se como um vaso vazio.

Caiu pela escada excessivamente abaixo.

Caiu das mãos da criada descuidada.

Caiu, fez-se em mais pedaços do que havia loiça no vaso. 

 

Asneira? Impossível? Sei lá!

Tenho mais sensações do que tinha quando me sentia eu.

Sou um espalhamento de cacos sobre um capacho por sacudir.

 

Fiz barulho na queda como um vaso que se partia.

Os deuses que há debruçam-se do parapeito da escada.

E fitam os cacos que a criada deles fez de mim. 

 

Não se zanguem com ela.

São tolerantes com ela.

O que era eu um vaso vazio? 

 

Olham os cacos absurdamente conscientes,

Mas conscientes de si mesmos, não conscientes deles. 

 

Olham e sorriem.

Sorriem tolerantes à criada involuntária. 

 

Alastra a grande escadaria atapetada de estrelas.

Um caco brilha, virado do exterior lustroso, entre os astros.

A minha obra? A minha alma principal? A minha vida?

Um caco.

E os deuses olham-no especialmente, pois não sabem por que ficou ali.

 

Poesias de Álvaro Campos

 

In “Fernando Pessoa – Antologia Poética” – 3ª. Edição

Biblioteca Ulisses de Autores Portugueses

Editora Ulisses

 

Álvaro de Campos/Fernando Pessoa

1890 – 1935

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito
Sábado, 1 de Junho de 2013

Recordando... Fernando Pessoa

ISTO

 

Dizem que finjo ou minto

Tudo que escrevo. Não.

Eu simplesmente sinto

Com a imaginação.

Não uso o coração.

 

Tudo o que sonho ou passo,

O que me falha ou finda,

É como que um terraço

Sobre outra coisa ainda.

Essa coisa é que é linda.

 

Por isso escrevo em meio

Do que não está ao pé,

Livre do meu enleio,

Sério do que não é.

Sentir! Sinta quem lê!

 

Cancioneiro

 

In “Fernando Pessoa – Antologia Poética”

3ª. Edição – Biblioteca Ulisses de Autores Portugueses

Editora Ulisses

 

Fernando Pessoa

1888 – 1935

publicado por cateespero às 00:00
link do post | Deixe seu comentário | favorito

.Eu

.pesquisar

 

.Março 2024

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
14
15
16
17
18
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31

.Ano XVI

.posts recentes

. Recordando... Ricardo Gil...

. Recordando... Saúl Dias *...

. Recordando... Ruy Belo

. Recordando... Rui Miguel ...

. Recordando... Rui Pires C...

. Recordando... Sebastião d...

. Recordando... Augusto Mol...

. Recordando... Egito Gonça...

. Recordando... António Ram...

. Recordando... Maria Auror...

.arquivos

. Março 2024

. Fevereiro 2024

. Janeiro 2024

. Dezembro 2023

. Novembro 2023

. Outubro 2023

. Setembro 2023

. Agosto 2023

. Julho 2023

. Junho 2023

. Maio 2023

. Abril 2023

. Março 2023

. Fevereiro 2023

. Janeiro 2023

. Dezembro 2022

. Novembro 2022

. Outubro 2022

. Setembro 2022

. Agosto 2022

. Julho 2022

. Junho 2022

. Maio 2022

. Abril 2022

. Março 2022

. Fevereiro 2022

. Janeiro 2022

. Dezembro 2021

. Novembro 2021

. Outubro 2021

. Setembro 2021

. Agosto 2021

. Julho 2021

. Junho 2021

. Maio 2021

. Abril 2021

. Março 2021

. Fevereiro 2021

. Janeiro 2021

. Dezembro 2020

. Novembro 2020

. Outubro 2020

. Setembro 2020

. Agosto 2020

. Julho 2020

. Junho 2020

. Maio 2020

. Abril 2020

. Março 2020

. Fevereiro 2020

. Janeiro 2020

. Dezembro 2019

. Novembro 2019

. Outubro 2019

. Setembro 2019

. Agosto 2019

. Julho 2019

. Junho 2019

. Maio 2019

. Abril 2019

. Março 2019

. Fevereiro 2019

. Janeiro 2019

. Dezembro 2018

. Novembro 2018

. Outubro 2018

. Setembro 2018

. Agosto 2018

. Julho 2018

. Junho 2018

. Maio 2018

. Abril 2018

. Março 2018

. Fevereiro 2018

. Janeiro 2018

. Dezembro 2017

. Novembro 2017

. Outubro 2017

. Setembro 2017

. Agosto 2017

. Julho 2017

. Junho 2017

. Maio 2017

. Abril 2017

. Março 2017

. Fevereiro 2017

. Janeiro 2017

. Dezembro 2016

. Novembro 2016

. Outubro 2016

. Setembro 2016

. Agosto 2016

. Julho 2016

. Junho 2016

. Maio 2016

. Abril 2016

. Março 2016

. Fevereiro 2016

. Janeiro 2016

. Dezembro 2015

. Novembro 2015

. Outubro 2015

. Setembro 2015

. Agosto 2015

. Julho 2015

. Junho 2015

. Maio 2015

. Abril 2015

. Março 2015

. Fevereiro 2015

. Janeiro 2015

. Dezembro 2014

. Novembro 2014

. Outubro 2014

. Setembro 2014

. Agosto 2014

. Julho 2014

. Junho 2014

. Maio 2014

. Abril 2014

. Março 2014

. Fevereiro 2014

. Janeiro 2014

. Dezembro 2013

. Novembro 2013

. Outubro 2013

. Setembro 2013

. Agosto 2013

. Julho 2013

. Junho 2013

. Maio 2013

. Abril 2013

. Março 2013

. Fevereiro 2013

. Janeiro 2013

. Dezembro 2012

. Novembro 2012

. Outubro 2012

. Setembro 2012

. Agosto 2012

. Julho 2012

. Junho 2012

. Maio 2012

. Abril 2012

. Março 2012

. Fevereiro 2012

. Janeiro 2012

. Dezembro 2011

. Novembro 2011

. Outubro 2011

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

. Abril 2010

. Março 2010

. Fevereiro 2010

. Janeiro 2010

. Dezembro 2009

. Novembro 2009

. Outubro 2009

. Setembro 2009

. Agosto 2009

. Julho 2009

. Junho 2009

. Maio 2009

. Abril 2009

. Março 2009

. Fevereiro 2009

. Janeiro 2009

. Dezembro 2008

. Novembro 2008

. Outubro 2008

. Setembro 2008

. Agosto 2008

. Julho 2008

. Junho 2008

. Maio 2008

. Abril 2008

. Março 2008

. Fevereiro 2008

. Janeiro 2008

. Dezembro 2007

. Novembro 2007

. Outubro 2007

. Setembro 2007

. Agosto 2007

. Julho 2007

. Junho 2007

. Maio 2007

. Abril 2007

.tags

. todas as tags

blogs SAPO

.subscrever feeds